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Morte e morrer

. Conceitos de morte. Morrer

sandra_john
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Morte e morrer

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Presentation Transcript


    1. Morte e morrer UMC Pierre Schippers

    4. Quatro valores nucleares da Medicina

    7. O bem do paciente

    10. Conselho Federal de Medicina Critrios para a Caracterizao de Morte Enceflica RESOLUO N. 1.480 8 DE AGOSTO DE 1997 Art. 1. A morte enceflica ser caracterizada atravs da realizao de exames clnicos e complementares durante intervalos de tempo variveis, prprios para determinadas faixas etrias. Art. 2 Os dados clnicos e complementares observados quando da caracterizao da morte enceflica devero ser registrados no termo de declarao de morte enceflica anexo a esta Resoluo. Pargrafo nico. As instituies hospitalares podero fazer acrscimos ao presente termo, que devero ser aprovados pelos Conselhos Regionais de Medicina da sua jurisdio, sendo vedada a supresso de qualquer de seus itens. Art. 3. A morte enceflica dever ser conseqncia de processo irreversvel e de causa conhecida.

    11. Conselho Federal de Medicina Critrios para a Caracterizao de Morte Enceflica Art. 4. Os parmetros clnicos a serem observados para constatao de morte enceflica so: coma aperceptivo com ausncia de atividade motora supra-espinal e apnia. Art. 5. Os intervalos mnimos entre as duas avaliaes clnicas necessrias para a caracterizao da morte enceflica sero definidos por faixa etria, conforme abaixo especificado: a) de 7 dias a 2 meses incompletos - 48 horas; b) de 2 meses a 1 ano incompleto - 24 horas; c) de 1 ano a 2 anos incompletos - 12 horas; d) acima de 2 anos - 6 horas. Art. 6. Os exames complementares a serem observados para constatao de morte enceflica devero demonstrar de forma inequvoca: a) ausncia de atividade eltrica cerebral ou, b) ausncia de atividade metablica cerebral ou, c) ausncia de perfuso sangnea cerebral.

    12. Art. 7. Os exames complementares sero utilizados por faixa etria, conforme abaixo especificado: a) acima de 2 anos - um dos exames citados no Art. 6, alneas ``a, ``b e ``c; b) de 1 a 2 anos incompletos: um dos exames citados no Art. 6, alneas ``a", ``b e ``c. Quando optar-se por eletroencefalograma, sero necessrios 2 exames com intervalo de 12 horas entre um e outro; c) de 2 meses a 1 anos incompleto - 2 eletroencefalogramas com intervalo de 24 horas entre um e outro; d) de 7 dias a 2 meses incompletos - 2 eletroencefalogramas com intervalo de 48 horas entre um e outro. Art. 8. O termo de Declarao de Morte Enceflica, devidamente preenchido e assinado, e os exames complementares utilizados para diagnstico da morte enceflica devero ser arquivados no prprio pronturio do paciente. Art. 9. Constatada e documentada a morte enceflica, dever o Diretor-Clnico da instituio hospitalar, ou quem for delegado, comunicar tal fato aos responsveis legais do paciente, se houver, e Central de Notificao, Captao e Distribuio de rgos a que estiver vinculada a unidade hospitalar onde o mesmo se encontrava internado. Art. 10. Esta Resoluo entrar em vigor na data de sua publicao e revoga a Resoluo CFM n 1.346/91. Conselho Federal de Medicina Critrios para a Caracterizao de Morte Enceflica

    13. Parecer do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA sobre Morte Enceflica Processo-consulta CFM n7.311/97 INTERESSADO: Hospital So Lucas da PUCRS ASSUNTO: Morte enceflica aspectos legais desligar os aparelhos RELATOR: Nei Moreira da Silva EMENDA: Os critrios para verificao de morte enceflica no se aplicam apenas s situaes de transplantes de rgos. Os mdicos devem comunicar aos familiares a ocorrncia e o significado da morte enceflica antes da suspenso da teraputica. CONSULTA Em 13/11/97, o hospital da PUCRS protocolou junto a este Conselho Federal a seguinte Consulta: "Frente resoluo do Conselho Federal de Medicina n1.480 de 1997, que normatiza e define critrios de morte enceflica em pacientes nas suas diversas faixas etrias, as unidades de tratamento intensivo (UTIs) Adulto Peditrica e Neonatal do Hospital So Lucas da PUCRS, abaixo representadas por suas chefias, assim como o Comit de Biotica deste Hospital vm solicitar o Vosso posicionamento no que se refere a:

    14. Parecer do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA sobre Morte Enceflica a esta resoluo refere-se constatao de morte apenas para fins de transplante ou aplica-se a qualquer paciente internado em UTI, mesmo queles que no candidatos a doao de rgos para transplante? b Aplicando os critrios estabelecidos por esta resoluo, constatando-se a morte enceflica de um paciente no candidato doao de rgos, os mdicos, dentro dos aspectos legais, PODEM (esto amparados legalmente para) suspender a teraputica de suporte (ventilao mecnica, vasopressores, etc.)? Neste caso, precisam da concordncia da famlia? c- Dentro dos aspectos legais, morais e ticos, aps constatada a morte enceflica, obedecendo os critrios estabelecidos por esta resoluo, os mdicos DEVEM suspender toda teraputica de suporte (ventilao mecnica, vasopressores, etc.)? Se devem, como se conduzir se a famlia no concordar?"

    15. PARECER A constatao da morte enceflica nos termos da Resoluo CFM N. 1.480/97 tem a sua maior motivao e aplicabilidade nos casos de transplante de rgos, em vista da necessidade de retirada dos mesmos antes que se instale a degradao hemodinmica que venha a comprometer o seu aproveitamento. No entanto, conforme se depreende da leitura dos seus considerandos, outras situaes alm dos transplantes esto contempladas. Assim, por exemplo, o descompasso entre a oferta e a demanda de leitos de terapia intensiva gera situaes em que mesmo sem a perspectiva de transplante, a verificao de morte enceflica em um paciente permitir a utilizao daquele leito de UTI por outro paciente ainda vivel quanto sobrevida. Igual preocupao tambm se aplica ao prolongamento da dor que se impem aos familiares dos pacientes em morte enceflica, submetidos a uma espera infrutfera que tem apenas um inexorvel desfecho: a parada cardaca. Nesses casos, indaga-se: tm os mdicos o poder/dever de suspender a teraputica de suporte? Necessitam de concordncia da famlia? E se a famlia no concorda? Sobre o tema, existe manifestao deste Conselho Federal, no Parecer n27/90, da lavra do Cons. Luis Carlos Sobnia, abaixo transcrito em parte: Parecer do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA sobre Morte Enceflica

    16. "Quando um paciente for considerado em "Morte Enceflica", portanto considerado em bito, o mdico responsvel pelo paciente, antes da suspenso dos meios artificiais de sustentao de funes vegetativas, dever comunicar o fato famlia, para que a mesma possa Ter tempo at de questionar o diagnstico, pois essa prtica ainda no entrou claramente na cultura do povo, e possa at solicitar outro profissional para confirmar o diagnstico..." Pensamos ser esta a conduta acertada frente a estas situaes: explicar a famlia a ocorrncia e o significado da morte enceflica e a total impotncia da medicina em reverter tal condio. A partir de ento, prolongar os cuidados passa a configurar injustificvel obstinao teraputica, sem qualquer benefcio para o "paciente" ou sua famlia. Fica ainda uma questo: se a famlia recusar-se a aceitar a interrupo dos cuidados, ainda que tal posio tenha sido referendada pelo mdico de sua confiana, tm os mdicos assistentes o poder de interromp-lo? Pensamos que sim, pois a verificao da morte por quaisquer critrios um ato de competncia do mdico. No entanto, devero Ter os mdicos a sensibilidade para que este seu poder no venha a constituir-se em uma causa adicional de dor queles que j passam pelo sofrimento da perda de um ente querido e que devem encontrar no mdico uma mensagem de alvio e solidariedade. o parecer, SMJ. Braslia, 2 de maro de 1998. Parecer do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA sobre Morte Enceflica

    17. Caso beb anencfalo O Servio de Ginecologia solicita uma consultoria ao Comit de Biotica do hospital. Uma paciente feminina, 23 anos de idade, no quarto ms de gravidez realiza exame ecogrfico e diagnosticada a presena de feto anenceflico. Ao ser informada do fato, a paciente e seu marido solicitam que seja interrompida a gravidez. Os membros do servio de ginecologia tem pareceres diferentes com relao a melhor conduta a ser tomada e solicitam uma consultoria ao Comit de Biotica com os seguintes questionamentos: a) moralmente aceitvel indicar o aborto nestas circunstncias? b) moralmente aceitvel a alternativa de levar a gravidez a termo e eventualmente usar recm nascido aps sua morte como doador de rgos? Quando o caso discutido no Comit de Biotica seus membros apresentam posies contraditrias com relao a questo . Alguns defendem o direito da me em decidir com relao ao seu corpo ao mesmo tempo em que ela ser protegida de algum acidente relacionado ao processo gravidez-parto, recomendando que aborto seja realizado enquanto que outros baseados no princpio moral de defesa incondicional da vida contra-indicam a realizao do mesmo. Existe uma unanimidade por parte dos membros do Comit em reprovar a alternativa de usar o recm-nascido com doador de rgos. O mdico assistente da paciente, baseado no seu sentimento do que representava os melhores interesse da paciente, decide interromper a gravidez.

    18. Caso (ano 2000) Gestao e Morte Enceflica Materna Uma senhora espanhola de 30 anos, que j havia preenchido o critrio enceflico de morte a algum tempo, deu luz um beb de 1290 g. Esta senhora quando j estava gravemente doente, antes de ficar inconsciente, assegurou na Justia Espanhola o direito de ser mantida viva, atravs de equipamentos de suporte vital, com a finalidade de prosseguir a gestao - recebia nutrio paraenteral e monitoramento assistido 24 horas por dia. Os meios de comunicao se referiam a ela como uma "espcie de incubadora natural". A criana nasceu, de parto cesreo, com sete meses e uma semana, pois havia o risco iminente de ocorrer parto espontneo. O estado de sade do beb pode ser considerado bom, ainda que tenha apresentado certa dificuldade respiratria. Os equipamentos de suporte vital da me foram desligados logo aps o nascimento. No Brasil, uma gestante aps um grave ataque de asma, teve tambm constatado o critrio enceflico de morte. Como o bebe ainda no era vivel, o esposo e os avs solicitaram equipe mdica que mantivesse esta senhora com equipamentos de suporte vital. Esta solicitao foi atendida. Aps o nascimento do bebe a famlia solicitou que a paciente contiuasse a ser mantida por aparelhos, pois achavam que desligar os mesmo era mat-la deliberadamente. A equipe mdica novamente atendeu solicitao.

    19. Um Estudo das Representaes Religiosas sobre Doaes de rgos e Sangue e Influncia da Definio do Momento da Morte. FUNDAMENTAO: Tendo em vista que o transplante de rgos tem sido alvo de muita polmica, especialmente agora com a regulamentao da nova lei n. 9.434 de fevereiro de 1997, onde ficou estabelecida a doao presumida de rgos tornou-se particularmente importante discutir a questo com vrias esferas da sociedade. Sendo o Brasil um pas de grande misticismo com uma alta variedade de cultos e doutrinas religiosas, consideramos pertinente realizar uma pesquisa com lderes e fiis de diversas religies. OBJETIVOS: Avaliar a relao ou a influncia entre prticas e crenas religiosas e adeso a determinadas prticas mdicas tais como doao de sangue, transfuso e transplante. Um dos temas da pesquisa a concepo de morte e vida que de fundamental importncia no entendimento da mobilizao para as doaes. MTODOS: Dividimos a pesquisa em duas fases, a primeira, que estamos finalizando, refere-se a abordagem dos lderes religiosos, a segunda fase diz respeito aos fiis. A metodologia utilizada com os lderes religiosos tem sido de entrevistas abertas, onde focalizamos primeiramente a trajetria do lder religioso, num segundo momento, abordamos os fundamentos gerais de cada religio e finalmente o posicionamento da religio sobre questes relativas a sade e mais especificamente a doao de sangue e rgos. Com os fiis partiremos do mtodo de pesquisa etnogrfica com a observao participante e posteriormente selecionaremos alguns fiis para entrevistar.

    20. RESULTADOS: A anlise preliminar de 15 (quinze) entrevistas mostra uma grande diversidade das religies sobre o entendimento do momento de morte, embora sendo ainda muito comum relacionar a morte fsica e ou o desligamento espiritual, com o momento da parada dos batimentos cardacos. CONCLUSES: Apesar de haver uma forte recorrncia por parte dos lderes religiosos em afirmarem-se favorveis a doaes de sangue e rgos, durante o desenrolar de suas falas, observamos inmeras contradies e mesmo excees. Assim podemos concluir que para a maioria das religies estudadas o transplante de cadver no visto como muito positivo pois causaria uma interferncia negativa no desligamento do esprito do corpo. Com relao ao momento da morte, a maioria das religies acredita que ela est vinculada parada do corao. Alm disso predomina a crena de que o esprito permanece por vrios dias ligado ao corpo e a retirada de rgos seria traumtica para o esprito. Um Estudo das Representaes Religiosas sobre Doaes de rgos e Sangue e Influncia da Definio do Momento da Morte.

    21. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico A filosofia j foi considerada, no passado, o aprendizado da morte. Desde Scrates, filsofo era aquele que sabia morrer. Funo da filosofia seria preparar-nos para uma boa morte, e o termo grego genrico, no caso, era mesmo eutansia. Supunha-se que aquele que sabe morrer aprendeu a viver, e assim a vida e a morte se iluminavam reciprocamente. No sculo XIX, poca dos grandes sistemas, a morte saiu da temtica central dos textos filosficos, e foi talvez Kierkegaard quem inaugurou uma nova perspectiva, chamada depois existencial, descrevendo a morte como algo que para cada um de ns certo, mas cuja hora bem incerta. Os filsofos da existncia, no sculo XX, aprenderam esse dado sob a frmula mais genrica da experincia da finitude humana. Para Heidegger, um dos existenciais que caracterizariam o homem o ser-para-a-morte: Zum-Tode-sein. Isto significaria que entre as diversas possibilidades do homem h uma que representa a possibilidade da impossibilidade, ou seja, quando esta ocorre, todas as demais possibilidades ficam excludas.

    22. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico No preciso ser nenhum filsofo para constatar, hoje em dia, que a gente no morre mais como antigamente. A hospitalizao, as unidades de terapia intensiva e a inveno dos transplantes caracterizam trs grandes tendncias do sculo XX que alteraram totalmente o horizonte da morte e do morrer. A perspectiva de ir terminar seus dias num leito de hospital, preso a uma srie de tubos e aparelhos, e como um eventual doador de rgos a serem retirados ainda vivos quando o paciente estiver legalmente morto (alis, numa definio de morte legal para fins precpuos de transplantes), no existia antes da ltima grande guerra mundial.

    23. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico Tcnicas extremamente artificiais que nos pareciam adequadas quando aplicadas a um jovem e forte soldado ferido gravemente no Vietn e que s precisava de algumas horas para chegar ao Hospital de Frankfurt, de onde teria grandes perspectivas de sair capacitado a uma reintegrao vida normal dos cidados, chocaram terrivelmente os brasileiros quando aplicadas ao presidente eleito Tancredo Neves, com um quadro clnico totalmente diferente. Tcnicas e procedimentos que do aos profissionais da sade novos poderes de retardar ao mximo a hora da morte implicam obviamente um acrscimo de responsabilidade na grave questo de definir afinal quando ento seria preciso desistir, aceitando o irreversvel. A tentativa de definir a ortotansia como um justo meio termo entre a eutansia (apressada), e a distansia (obstinada), parece ser antes um sintoma do problema do que uma verdadeira e definitiva soluo. Alis, para quem aceitar um pluralismo de definies da morte, entendida de vrias maneiras como um processo, parece que o conceito genrico da irreversibilidade continuar como o mais proveitoso ou operacional nos diversos casos. Nem todos preferem, claro, a definio enunciada por H. Tristam Engelhardt, Jr. (Fundamentos da Biotica, 1998, p. 296) da pessoa que se consideraria morta quando seu corpo comeasse a cheirar mal sob o sol do vero do Texas. E se os mais obstinados na recusa da hora da morte chegam a pedir para serem congelados, h um dado que mesmo eles deveriam levar em conta: ningum, a rigor, pode dar garantia absoluta de que daqui a 50 ou 100 anos, quando a medicina tiver descoberto a cura da doena que os condenou, haver lugar no planeta para (o retorno de) mais um indivduo, na hiptese da superpopulao. De modo que o projeto da conservao crinica lembra a muitos filsofos o conceito da m infinitude, que lana para o puramente quantitativo algo que teria de ser resolvido em termos qualitativos.

    24. Entre os filsofos que do ateno s questes da Biotica, h dois nomes que muito se destacam no tratamento dos assuntos relacionados com a morte: Robert Veatch e Peter Singer. Por ser o primeiro bastante conhecido entre ns, especialmente pelo Prof. Carlos Fernando Francesconi, proponho-me a trazer agora para a discusso algumas das idias do eticista australiano (de origem austraca e judaica) Peter Singer, que inclusive publicou em 1994 um livro que, traduzido aos espanhol h cinco anos, intitulou-se Repensar la vida y la muerte.El derrumbe de nuestra tica tradicional (Paids, Barcelona, Buenos Aires, Mxico). Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    25. Peter Singer faz jus fama de pensador polmico. Introduz as questes com exemplos de casos limites, como o de 1993, da assaltante drogada e grvida de 17 semanas que, ferida bala na cabea e com morte enceflica, foi mantida numa UTI norte-americana por mais de trs meses, at a cesariana de um prematuro. Clinicamente morto, mas com o corao batendo graas aos aparelhos, este corpo materno serviu de suporte para a reproduo da vida. A despesa total de mais de 400 mil dlares d a entender que os procedimentos adotados a fim de chegar a mandar esta criana para casa no valem para a prtica usual, mas somente para uma experincia de ponta. Um corpo rosado e quente, ao qual se aplicam os cuidados da higiene, da ginstica e da fisioterapia, um corpo por onde circulam os diversos fluidos vitais, um corpo que est (ativa ou passivamente, - como definir?) gerando um novo ser humano, uma pessoa viva, que dever morrer quando o beb nascer, ou apenas uma incubadora que ser simplesmente desligada sem nenhum problema tico quando se alcanar o resultado desejado? Temos aqui um caso de respeito vida que sagrada, ou uma experincia talvez perversa com alto grau de manipulao desrespeitosa? Quem vai decidir? Num caso semelhante, ocorrido em 1992 na Alemanha, o assessor jurdico da clnica de Erlangen tentou decidir a questo nos seguintes termos: O respeito por um corpo morto no em absoluto uma exigncia tica, enquanto que o direito vida sim o . (Singer, op. cit., p. 27) - Mas houve quem mencionasse o Dr. J. Mengele como o predecessor de tais experincias. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    26. Numa situao bem diferente, verdade, ningum comparou ao Dr. Mengele o pioneiro dos transplantes de corao, Dr. Christiaan Barnard, embora seu primeiro doador ainda no estivesse enquadrado na definio legal da morte enceflica, uma vez que em 1967 tal lei ainda nem existia. Podemos imaginar que a deciso de Barnard tenha exigido dele uma redefinio da questo tica, e que ele tenha agido como pioneiro tambm na tica, talvez at conhecendo a tese do Papa Pio XII, que em 1957 j definira que a definio da hora da morte assunto para os mdicos (sobretudo o anestesista), e no para os telogos. O capelo do Hospital de Erlangen podia considerar, no segundo caso mencionado, que, para ele, uma mulher estaria morta quando plida e rgida, mas pela jurisprudncia alem ela estava morta mesmo com o corao batendo. Pelas leis da Califrnia, no caso anterior, a me estava morta havia trs meses, quando o filho chegou a nascer. Assim, nem ousamos dizer que ela deu luz, pois um cadver nem pode ser chamado propriamente de ela ou de me. Estranho que as enfermeiras a tratavam como uma enferma em fase terminal, e no como um cadver! E um jornal de San Francisco noticiava: Mulher com morte cerebral d luz e logo morre. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    27. O problema da definio tradicional da morte que ela, como muitas outras definies tradicionais, circular. Morremos quando deixamos de viver, e deixamos de viver quando morremos. medida que vamos morrendo, nossos diversos rgos vo parando de funcionar, e na medida que os rgos vo parando de funcionar, morremos. Mesmo definindo a morte no momento da parada definitiva das funes enceflicas (para assim evitar a circularidade), ficamos com um problema: como definir quando morre um beb que jamais teve crebro? Uma definio como a da morte enceflica, proposta pelo Comit de Harvard e adotada em muitos pases, a alternativa tcnica e prtica para o problema dos transplantes. Talvez no seja muito mais do que isto, para quem no a reconhece como irreversvel. Mas esta redefinio da morte, tal como foi proposta pelo Comit de Harvard, baseada na perda irreversvel do funcionamento do crebro, criou um consenso entre os mdicos, e assim revelou-se uma definio bem sucedida, adotada pela maioria dos pases desenvolvidos. Um problema adicional que o crebro, alm das funes da conscincia e da vontade, funes que tanto dignificam o ser humano, tambm tem funes de regular o funcionamento do resto do corpo, as quais porm podem ser mantidas artificialmente. Ou seja, o crebro, nesta funo, substituvel. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    28. A maioria da populao pode at pensar que os bebs que nascem sem crebro so casos rarssimos, mas conforme Singer ocorre um a cada dois mil partos, de modo que nos Estados Unidos nascem por ano uns trezentos bebs anenceflicos. Mas se a parte superior do crebro no funciona, a criatura no pode ver, nem ouvir e nem sentir, no pode sofrer nem ter emoes, no pode querer e nem pensar, embora possa respirar e seu corao possa bater, j que isso depende da parte inferior do crebro. O caso da menina K, relatado por Singer (p. 51), parece ser o mesmo contado em Porto Alegre por Veatch, que participou dele como perito. Nascida anenceflica em Falls Church, Virginia, em outubro de 1992, sobreviveu mais de um ano porque sua me insistiu em mant-la viva, o que era possvel, alis, com a ajuda ocasional de um respirador, que os mdicos consideraram exagerado e ftil. A f desta me, de resto solteira e negra, mandava-lhe proteger qualquer forma de vida humana, segundo a tica tradicional da santidade da vida. Para a maioria, provavelmente, a morte a perda irreversvel da capacidade de conscincia. Consequentemente, uma criana que jamais atingir os nveis mnimos de conscincia, no precisa sobreviver mais do que aquele tempo necessrio para a me trabalhar o sentimento desta perda. De um caso semelhante, diz Singer: o beb nascera demasiado prematuramente e sofrera uma grave hemorragia cerebral (...), padecia de morte cortical, e no podia ter nenhum futuro. No havia esperanas e no havia nenhuma razo para continuar com um tratamento, mas os mdicos estavam dando um tempo aos pais para que se adaptassem e chorassem a perda antes de tirar o beb do respirador. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    29. Colocar o acento da sacralidade da vida no desempenho atual ou potencial das faculdades digamos espirituais, como a autoconscincia, a vontade e a relao interpessoal, centraliza o debate no conceito de pessoa humana. Se este conceito eqivale a uma dignidade que se adquire (analogamente personalidade jurdica do Imprio Romano), podemos ento at dizer que um beb merece respeito pela solidariedade dos pais, e que um zigoto biologicamente humano merece este mesmo respeito, mas por uma espcie de adscrio que faz com que o consideremos como se j fosse uma pessoa humana, - porm a verdade que ele ainda no o . Se um feto abortado espontaneamente merecesse o mesmo respeito que uma criana, certamente as igrejas lhe dariam pompas fnebres, o que no o caso. Singer, surpreendentemente, considera que a definio de morte apenas pela parada irreversvel das partes superiores do crebro, embora prtica e lgica, no deixa de ser errnea. Lembrando a Rainha Vermelha, de Alice no Pas das Maravilhas, que passava meia hora cada manh tentando acreditar em coisas impossveis, diz que seria preciso conseguir o mesmo para aceitar que estejam mortos pacientes com corpo quente, corado e flexvel, que respiram e podem continuar respirando mesmo sem aparelhos. Sua sugesto, contudo, de que no precisaramos definir tais pacientes ou bebs anenceflicos como mortos para autorizar que sejam doadores, desde que o diagnstico no deixasse lugar a dvidas. Em termos brasileiros isto eqivaleria a dizer que a morte enceflica s morte para fins de transplantes, mas que de resto no morte. Como, porm, a sugesto de Singer no foi adotada, os anenceflicos no podem morrer, para fins de transplantes, e portanto no servem como doadores. S morrem quando comeam a deteriorar-se, sendo ento desligados do respirador. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    30. O Parlamento da Dinamarca criou em 1987 um Conselho de tica, para assessorar o Ministrio da Sade. Como no utilizavam o conceito de morte cerebral, o Conselho consultou a populao e props que o critrio da morte continuasse sendo a interrupo total e irreversvel da circulao e da respirao, porm admitindo que a parada de todas as funes cerebrais caracterizaria um processo irreversvel de morte (Singer, p. 63). A partir da, o paciente no teria mais direito a outros meios artificiais para manter-se vivo, pois o moribundo no tiraria nenhum benefcio disto. Porm o Conselho de tica Dinamarqus recomendou ento que se utilizassem aqueles meios artificiais que retardariam a concluso do processo de morte, por mais 48 horas, para que se pudessem extrair os rgos, desde que a pessoa no tivesse registrado previamente sua recusa doao. Tal soluo, para Singer, tem o mrito de distinguir claramente trs questes: 1) Quando morre um ser humano? 2) Quando lcito deixar de intentar manter vivo um ser humano? 3) Quando lcito extrair rgos de um ser humano com o fim de transplant-los a outro ser humano? Apesar do mrito filosfico dessa proposta, ela no foi aceita, e a Dinamarca acabou alinhando-se, por uma lei de 1990, ao grupo dos pases europeus que aceitam a morte cerebral como um critrio da morte. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    31. na Gr-Bretanha ento que Singer vai procurar uma soluo. L existem provavelmente entre 1000 e 1500 pessoas em estado vegetativo permanente (PVS), em hospitais e clnicas. O caso de Tony Bland (1989), pisoteado pela torcida de um jogo de futebol, parece-lhe emblemtico. Se na multido morreram 95 pessoas pisoteadas, Tony Bland no morreu, mas com o pulmo esmagado ficou sem oxignio, e o crtex se destruiu. O juiz local no permitiu que se pusesse fim vida de Tony Bland intencionalmente, pela interrupo da alimentao artificial. - Nos Estados Unidos, um caso semelhante, de Nancy Beth Cruzan, tivera como desfecho um epitfio onde consta: Nasceu em 20 de julho de 1957. / Morreu em 11 de janeiro de 1983. / Em paz em 26 de dezembro de 1990 (Singer, p. 72) - Ora, a deciso final inglesa, no caso de Tony Bland, levou em conta a qualidade de vida (e no a santidade da mesma): sua vida no valia mais a pena; e embora ele fosse inocente, era lcito provocar-lhe a morte, negando-lhe a satisfao das necessidades vitais bsicas, por razes humanitrias. - O famoso caso de Karen Quinlan buscara apoiar-se, com a ajuda da igreja catlica, no conceito de recursos ordinrios e extraordinrios, mas para Singer isso apenas disfara a questo da inteno de interromper uma vida que j no tem mais nenhum sentido humano. No caso desta moa, alis, o recurso extraordinrio resumia-se a um respirador (que no pode ser considerado, a rigor, um tratamento penoso para a paciente). Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    32. No caso de Tony Bland, ser que os juizes da Cmara dos Lordes teriam sancionado uma eutansia no-voluntria? Se a lei britnica permite que um paciente deixe de ser alimentado artificialmente, a questo tica no est no fato de ser uma omisso ao invs de uma ao, mas se baseia na idia de que a vida desses pacientes em estado vegetativo persistente no lhes traz mais nenhum benefcio. Mesmo preservadas, so existncias apenas biolgicas, no so mais vida humana. (Alis, se preferssemos utilizar uma linguagem mais kierkegaardiana, bastaria inverter os substantivos: mantm apenas a vida biolgica, sem um sentido, e no se realizam mais numa existncia humana.) - Mas, provocador como , Peter Singer pergunta ento: Se desconectar um tubo pode eventualmente ser legal, por que no o seria aplicar uma injeo letal? Ele pergunta: Que base tica tem tal distino? (p. 87) E conclui esta parte do livro considerando madura a necessidade de uma nova tica. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    33. Tomando o caso do aborto, Singer critica o grupo pro choise, pois ele cr que s vezes uma boa poltica pode ser tambm m filosofia: se verdade que o feto tem os mesmos direitos do beb, ento no cabe me escolher, assim como a escravido no pode depender de uma escolha do negreiro... (p. 93) Mas Peter Singer mais do que um filsofo provocante. Para muita gente, ele irritante, e talvez por uma razo principal: no sendo um idealista utpico a traar ideais impossveis de realizar na prtica, embora absolutos na exigncia, no sendo um deontologista partidrio de uma tica de inteno, mas posicionando-se antes voltado para uma tica da responsabilidade, para as possibilidades reais e realizveis, mesmo com recursos finitos, e assumindo assim a dimenso da finitude e a conseqente necessidade de administrar de maneira sistmica nossas aes, Singer relaciona todas as coisas, mostra as suas diversas implicaes recprocas, como quando escreve: Para ser justo eu deveria acrescentar que descrever o movimento anti-abortista como pr vida to errneo como definir os defensores do aborto legal como pr escolha. H poucos vegetarianos no movimento pr vida. A maioria dos seus membros traam uma linha marcada entre os seres humanos, cujas vidas desejam proteger, e os animais no humanos, cujo assassinato defendem cada vez que comem. Por essa razo, o movimento deveria chamar-se pr vida humana. Mas isso no seria totalmente correto, porque o movimento no contra os assassinatos nas guerras ou a pena de morte. Portanto, a definio que mais se ajusta pr vida humana inocente. E nem sequer esta muito exata, porque o movimento no faz nada para salvar as crianas da morte por desnutrio ou enfermidades evitveis nas regies mais pobres do mundo, embora esta seja - comparada com lutar contra o aborto - uma forma muito mais segura e eficaz de salvar vidas de seres humanos inocentes.(p. 94) Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    34. Embora nossa apresentao das idias de Singer deva concentrar-se mais nas relacionadas com a morte, no resistimos a tentao de mostrar como ele, ao repensar a vida, em seus incios, busca argumentos em favor de uma posio que comea a respeitar o embrio depois de duas semanas. Ele o faz com um curioso experimento mental (p. 101), o da possibilidade de subdiviso depois da fecundao. Se queremos tratar o conjunto de clulas como se fossem indivduos, por que ento no utilizar nomes prprios, para personalizar? Escreve ele: Se considerarmos o embrio como um indivduo desde a concepo - chamemo-lhe Marion -ento, o que sucede a Marion se o embrio se divide? Os gmeos recm formados so Marion e um novo gmeo, por exemplo, Ruth? Ou se trata de dois novos gmeos, por exemplo, Ruth e Esther? Ambas as respostas suscitam paradoxos. Se Marion ainda existe, qual dos dois gmeos ela? No h nenhuma base para dizer que um deles esteja mais vinculado Marion original do que o outro. Mas se nenhum dos dois novos gmeos Marion, o que ter sucedido a ela? Ter desaparecido? Deveramos ento lamentar a perda de um ser humano, como eu lamentaria a perda de uma de minhas filhas, mesmo que ela fosse substituda por outras duas? Por isso, Singer conclui que s deveramos falar de um indivduo humano uns 14 dias aps a concepo, quando o novo ser j no se divide mais, e ao menos neste sentido realmente um indivduo. - Isto, sem falar de que a expresso o momento da concepo hoje se revela extremamente vaga, a ponto de os cientistas alemes congelarem vulos com o espermatozoide j dentro, mas ainda no fundidos: a concepo, s ela, dura umas 24 horas. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    35. Um outro problema atual foi aludido pelo especialista em biotica alemo Hans-Martin Sass: Se a interrupo da vida cerebral critrio de morte, haveria algo inversamente proporcional no incio, e a vida humana comearia com os primeiros sinais da atividade cerebral? De qualquer maneira, Singer acha que o critrio da morte cerebral constitui uma deciso tica, no uma deciso cientfica (p. 110). Quanto a isso Singer pode estar certo, pois a tica trabalha com os dados existentes disponveis, caso contrrio teramos de aceitar geraes inteiras sem tica, enquanto a cincia demorasse a fazer suas descobertas, o que no seria tico. Pois todos os homens de todas as pocas devem estar igualmente prximos da tica. Infelizmente, no cabe nesta comunicao introdutria a interessantssima questo da necessidade de uma reclassificao zoolgica do Homo sapiens, que levasse em conta nosso estreito parentesco com os chimpanzs, conforme as propostas de Richard Dawkins e Jared Diamond e que talvez nos definissem como o terceiro chimpanz. Mas se pertencemos mesma famlia e ao mesmo gnero dos chimpanzs e dos gorilas, o que isso altera em termos de definio da morte do homo sapiens? E o que muda em relao problemtica da pessoa? Existem pessoas no-humanas, em nosso planeta? Singer radicaliza sua posio perguntando: Por que deveramos considerar sacrossanta a vida de uma criana anenceflica e acreditar-nos com liberdade para matar gibes para utilizar seus rgos? (p. 182 Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    36. Outra questo que irrita, e que uma questo filosfica, mas que permanece aberta discusso na obra de Singer, a de saber se aes e omisses se eqivalem. Nosso autor no fecha a questo. At modula e modera suas respostas. Ao mesmo tempo em que libera o mdico de escrpulos nos casos de terem de escolher entre duas vidas, tal posio tem o seu preo ao aumentar a responsabilidade: Num mundo com meios de transportes e de comunicao modernos, no qual algumas pessoas vivem beira da inanio enquanto outras possuem enormes fortunas, sempre h algo que possamos fazer em alguma parte, para manter com vida uma pessoa enferma ou mal-nutrida. Que todos os que vivemos em pases ricos, com rendas muito superiores s necessrias para satisfazer nossas necessidades, deveramos estar fazendo muito mais para ajudar as pessoas de pases mais pobres a ter um nvel de vida que lhes permita enfrentar suas necessidades, uma questo com a qual a maioria das pessoas srias estar de acordo; mas o aspecto preocupante desta idia de responsabilidade que no parece haver um limite sobre o quanto devemos fazer. Se somos to responsveis pelo que deixamos de fazer quanto pelo que fazemos, estar errado comprar roupa da moda ou cear num restaurante caro quando este dinheiro poderia haver salvo a vida de um desconhecido que morre por no ter o suficiente para comer? O no doar dinheiro a organizaes de ajuda realmente uma forma de assassinato ou algo to errado quanto matar?(p. 192s.) Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    37. Convm agora, resumidamente, esboar as concluses do autor que escolhemos, e que aparecem na terceira parte do livro. Para sermos brutalmente rpidos, h que enunciar dois pressupostos que para ele sustentam a tica tradicional. O primeiro desses supostos que somos responsveis pelo que fazemos intencionalmente, mas de certo modo no somos responsveis pelo que no impedimos deliberadamente. O segundo que as vidas de todos os membros de nossa espcie, e somente deles, merecem maior proteo que a vida de qualquer outro ser. (p. 215) Sem esses dois pressupostos a tica que Singer chama tradicional no pode sobreviver. - Por fim, Peter Singer enumera cinco mandamentos daquela que chama tica tradicional e a cada um vai antepondo um novo mandamento, na nova perspectiva. Diferentemente do livro, apresentaremos os cinco mandamentos tradicionais e depois os cinco mandamentos reformados. 1o. antigo mandamento: Considerar que toda vida humana tem o mesmo valor; 2o. antigo mandamento: Nunca pr fim intencionalmente a uma vida humana inocente; 3o. antigo mandamento: Nunca tires tua prpria vida e tenta evitar que outros tirem as suas; 4o. antigo mandamento: Crescei e multiplicai-vos; 5o. antigo mandamento: Considera qualquer vida humana sempre mais valiosa que qualquer vida no humana. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    38. 1o. novo mandamento: Reconhecer que o valor da vida humana varia; 2o. novo mandamento: Responsabiliza-te pelas conseqncias de tuas decises; 3o. novo mandamento: Respeita o desejo de viver e de morrer de uma pessoa; 4o. novo mandamento: Trazer ao mundo apenas crianas que sejam desejadas; 5o. novo mandamento: No discriminar em razo da espcie. Dissemos que Peter Singer um filsofo. E ele o inclusive ao buscar coerncia em sua proposta e ao se recusar a entender a tica como um terreno de opinies arbitrrias ou mesmo traado apenas pelas emoes. Considera que essa seria uma viso conservadora da tica. No essa a dele, que se baseia em conceitos racionais, argumentos e discusses. Pois se algum nos disser: Muito bem, esta a tua opinio, mas eu tenho a minha, isto no deve jamais representar o final da discusso. Singer sabe tambm que a temtica da vida e da morte somente uma parte da tica, embora muito importante. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosfico

    39. Muitas vezes um profissional de sade fica com um conflito interno entre contar ou no uma m notcia para o seu paciente ou seus familiares. Na realidade, salvo algumas pouqussimas excees, a questo que deve ser colocada "qual a melhor maneira de contar esta m notcia ?" ou ainda "como vou dividir estas informaes ?" Os pacientes ou seus familiares normalmente passam pelos mesmos estgios quando recebem uma m notcia. Estes estgios foram classificados pela Dra. Kbler-Ross para pacientes que estavam morrendo. Inmeras outras situaes presentes na prtica dos profissionais de sade, como a comunicao de diagnsticos de doenas genticas, por exemplo, podem fazer com que as pessoas passem por estgios semelhantes. Os estgios so os seguintes: Choque inicial; Negao e isolamento; Raiva; Barganha; Depresso; Aceitao Estgios do Processo de Entendimento de Ms Notcias (incluindo morte)

    40. A compreenso deste processo pode auxiliar o profissional de sade a entender estes sentimentos e a auxiliar estas pessoas de uma forma mais adequada a esta situao de crise. Muitas pessoas abordam as situaes de crise apenas pelo seu lado ameaador, pelo risco envolvido. Porm, desde os antigos chineses, a palavra crise tambm comporta uma interpretao de oportunidade, de uma chance de crescimento. Desta forma, uma m notcia pode ser tambm ser geradora de crescimento pessoal, s vezes associado a muito sofrimento, mas que pode ser suportado desde que entendido e elaborado adequadamente. O sentimento de esperana tambm pode estar presente, paralelamente, a partir do estgio da "Raiva". Os profissionais de sade podem auxiliar os pacientes e familiares a associar a esperana, com base na realidade, a todos os demais estgios. Muitas vezes esta tarefa pode ser a de restituir ainda que seja uma "desesperanada esperana", ou melhor, uma "esperana de poder ter novas esperanas". Estgios do Processo de Entendimento de Ms Notcias (incluindo morte)

    41. Morte e Envelhecimento O envelhecimento trs consigo a perspectiva da morte. Mesmo com a aumento da sobrevida da populao humana, a vida sempre um perodo finito. Esta finitude passa a ser mais contundente com a chegada da velhice. A perda de amigos, familiares e de pessoas de referncia social refora esta caracterstica. Quando existe uma doena grave ou outra condio de sade, incluindo-se aspectos fsicos, mentais e sociais, que gera sofrimento a morte passa a ser no s uma probabilidade, mas tambm uma alternativa. Esta possibilidade passa por um dilema bsico: o ser humano proprietrio ou guardio da vida. Caso seja considerado proprietrio pode dispor da sua prpria vida, caso seja guardio deve zelar pela mesma. Esta ltima a perspectiva da maioria das religies, pois consideram que a vida um dom divino, sendo o ser humano responsvel pela sua preservao. Um ponto fundamental a ser esclarecido o que diz respeito ao estabelecimento limites de tratamento. Um tratamento pode ser considerado como uma medida ordinria, extraordinria ou ftil. As medidas ordinrias so mandatrias, devem ser propostas e trazem potencial benefcio para a pessoa, mesmo com riscos associados. As medidas extraordinrias so procedimentos teraputicos que no podem ser obtidos sem gastos excessivos, dor ou outro incmodo, ou, se utilizados, no oferecem uma possibilidade razovel de benefcio. Entende-se por futilidade a ausncia de motivo ou de resultado til em um procedimento diagnstico ou interveno teraputica. A determinao envolve, freqentemente, juzos de valor, particularmente quando o objetivo a qualidade de vida. A futilidade pode ser caracterizada como sendo um tratamento sem valor teraputico. Cabe relembrar que os profissionais de sade tem a obrigao de cuidar sempre, mas no de tratar sem que haja benefcios .

    42. O limite de tratamento muito mais facilamente aceito em pessoas muito idosas que em jovens e crianas. Nestas decises o critrio da idade serve como atenuante do impacto. Qual a justificativa para assumir que uma pessoa com mais de 65 anos tenha um prognstico pior que um jovem em iguais condies ? Vrios autores tem utilizado o critrio de idade para justificar situaes que poderiam ser caracterizadas no como a aceitao de limites teraputicos, mas sim de abandono teraputico. Em muitas reflexes sobre a morte o tema da eutansia e do suicdio assistido esto presentes. A eutansia foi muito utilizada em vrios pases do mundo, nas dcadas de 1920 e 1930. Foi utilizada como uma medida eugnica matando doentes mentais, deficientes e tambm muitos velhos, com a justificativa de liberar a sociedade destas pessoas consideradas como um encargo. A partir da dcada de 1960, a discusso da eutansia retornou, com outro enfoque, devido aos avanos tecnolgicos postos disposio das equipes de sade, que mudaram inclusive a prpria definio e critrios para o estabelecimento da morte. Morte e Envelhecimento

    43. A eutansia em velhos assume uma importncia muito grande, principalmente no que se refere s questes de respeito autonomia. O importante caracterizar que esta deciso plenamente consciente, que ela no est sendo tomada devido a uma estado depressivo. Na legislao australiana sobre eutansia, que foi revogada, havia a exigncia de uma avaliao psiquitrica para afastar esta possibilidade. O Prof. Lolas, da Universidade do Chile e do Programa Latino-Americano de Biotica da OPS, tem alguns relatos de pacientes que haviam solicitado aos seus mdicos interrupo de seu tratamento ou a tomada de medidas diretas com o objetivo de causar a sua morte, uma vez tratados de sua depresso, agradeceram seus mdicos por no terem atendido ao seu pedido. Morte e Envelhecimento

    44. Modos de Morrer No resposta a reanimao plena Morte que sobrevem mesmo com um manejo agressivo em Unidade de Terapia Intensiva incluindo tentativas de reanimao plena. Deciso de no reanimar Tambm denominada de ordem de no reanimao (do-not-ressucitate order - DNR). uma deciso prvia a ocorrncia de uma parada cardiorrespiratria, devidamente discutida com toda a equipe, o paciente ou familiares, no sentido de no implantar as medidas de reanimao. No implantao de medidas de suporte de vida Deciso de no implantar medidas de suporte de vida, que seriam medicamente apropriadas e potencialmente benficas, pelo entendimento de que o paciente morrer sem a teraputica em questo. As medidas propostas so consideradas fteis, por no alterarem o prognstico do paciente. Retirada de medidas de suporte de vida Trmino ou retirada de medidas teraputicas com a finalidade explcita de no substituir por um tratamento alternativo equivalente. Est claro que o paciente ir morrer no seguimento da alterao do processo teraputico. Esta retirada est moralmente e tecnicamente justificada apenas quando as medidas forem consideradas fteis.

    45. Modos de Morrer em Unidades de Tratamento Intensivo Vrios autores tem se preocupado com a questo do modo de morrer dos pacientes internados em Unidades de Tratmento Intensivo. Lantos, Berger e Zucker publicaram em 1993 um artigo sobre a utilizao de ordens para no reanimar pacientes peditricos. Os resultados indicavam que 30% dos 54 pacientes peditricos de uma UTI de Chicago/EEUU morreram sem que fossem feitas manobras de reanimao, devido a decisos prvia neste sentido. Os dados referiam-se a um perodo de uma ano de acompanhamento. Oestudo multicntrico SUPPORT (Study to Understand Prognoses and Preferences for Outcomes and Risks of Treatment), realizado nos Estados Unidos durante quatro anos, iniciou com a seguinte afirmao: "os mdicos tratam seus pacientes doentes graves mais extensivamente do que eles escolheriam para si prprios". Os sentimentos decorrentes desta constatao, percebida por muitos mdicos intensivistas mesmo antes deste estudo, fizeram com que vrias pesquisas fossem realizadas em diferentes locais do mundo sobre os diferentes modos de morrer dos pacientes internados em Unidades de Tratamento Intensivo. Um estudo nacional realizado por Predengast, Claessens e Luce, com dados de 1997, nos Estados Unidos avaliou o modo de morrer de 6303 pacientes, aps avaliar 74502 internaes em UTIs. No HCPA foi realizado um estudo por Carvalho e colaboradores, avaliando o modo de morrer de 44 pacientes da UTIPeditrica, no perodo de julho/96 a junho/97. Em ambos estudos foram considerados os mesmos critrios para avaliar o modo de morrer: morte enceflica, no resposta a manobras de reanimao cardiorrespiratria, deciso de no reanimar, no adoo de medidas de suporte de vida e retirada de medidas de suporte de vida.

    46. Modos de Morrer em Unidades de Tratamento Intensivo

    47. Oestudo de Lantos e colaboradores no apresentou dados referentes a no adoo ou retirada de medidas de suporte de vida. Desta forma, a comparao entre os resultados, exceto o relativo morte enceflica, fica prejudicado. No foram verificadas diferenas significativas entre as casusticas norte-americana e brasileira quanto a no resposta a manobras de reanimao, quanto a deciso de no reanimar e a no adoo de medidas de suporte. A ocorrncia de morte enceflica foi significativamente maior na amostra brasileira (X2=55,19; p<0,000001), quando comparada com o estudo geral de vrias UTIs norte-americanas. Quando comparada com o estudo de Lantos, a proporo de mortes enceflicas no apresentou diferenas significativas. A retirada de medidas de suporte de vida foi maior na amostra norte-americana (X2=6,33; p<0,01) comparativamente a amostra do HCPA. Modos de Morrer em Unidades de Tratamento Intensivo

    48. Eutansia A palavra eutansia tem sido utilizada de maneira confusa e ambgua, pois tem assumido diferentes significados conforme o tempo e o autor que a utiliza. Vrias novas palavras, como distansia, ortotansia, mistansia, tm sido criadas para evitar esta situao. Contudo, esta proliferao vocabular, ao invs de auxiliar, tem gerado alguns problemas conceituis. O termo Eutansia vem do grego, podendo ser traduzido como "boa morte"ou "morte apropriada". O termo foi proposto por Francis Bacon, em 1623, em sua obra "Historia vitae et mortis", como sendo o "tratamento adequado as doenas incurveis". De maneira geral, entende-se por eutansia quando uma pessoa causa deliberadamente a morte de outra que est mais fraca, debilitada ou em sofrimento. Neste ltimo caso, a eutansia seria justificada como uma forma de evitar um sofrimento acarretado por um longo perodo de doena. Tem sido utilizado, de forma equivocada, o termo Ortotansia para indicar este tipo de eutansia. Esta palavra deve ser utilizada no seu real sentido de utilizar os meios adequados para tratar uma pessoa que est morrendo.

    49. O termo eutansia muito amplo e pode ter diferentes interpretaes. Um exemplo de utilizao diferente da que hoje utilizada foi a proposta no sculo XIX, os telogos Larrag e Claret, em seu livro "Pronturios de Teologia Moral", publicado em 1866. Eles utilizavam eutansia para caracterizar a "morte em estado de graa". Existem dois elementos bsicos na caracterizao da eutansia: a inteno e o efeito da ao. A inteno de realizar a eutansia pode gerar uma ao (eutansia ativa) ou uma omisso, isto , a no realizao de uma ao que teria indicao teraputica naquela circunstncia (eutansia passiva). Desde o ponto de vista da tica, ou seja, da justificativa da ao, no h diferena entre ambas. Eutansia

    50. Da mesma forma, a eutansia, assim como o suicdio assistido, so claramente diferentes das decises de retirar ou de no implantar um tratamento, que no tenha eficcia ou que gere srios desconfortos, unicamente para prolongar a vida de um paciente. Ao contrrio da eutansia e do suicdio assistido, esta retirada ou no implantao de medidas consideradas fteis no agrega outra causa que possa conduzir morte do paciente. Esta, porm, no foi a interpretao da Suprema Corte de Nova Iorque, julgando o caso Quill, em 08 de janeiro de 1997, quando afirmou no haver diferenas legais e morais entre no implantar ou retirar uma medida extraordinria e o suicdio assistido. Em junho de 1997 a Suprema Corte Norte Americana, se pronunciou contrariamente a esta posio, afirmando que existem diferenas entre estas decises, quer do ponto de vista mdico quanto legal. A tradio hipocrtica tem acarretado que os mdicos e outros profissionais de sade se dediquem a proteger e preservar a vida. Se a eutansia for aceita como um ato mdico, os mdicos e outros profissionais tero tambm a tarefa de causar a morte. A participao na eutansia no somente alterar o objetivo da ateno sade, como poder influenciar, negativamente, a confiana para com o profissional, por parte dos pacientes. A Associao Mundial de Medicina, desde 1987, na Declarao de Madrid, considera a eutansia como sendo um procedimento eticamente inadequado. Eutansia

    51. Distansia: Morte lenta, ansiosa e com muito sofrimento. Alguns autores assumem a distansia como sendo o antnimo de eutansia. Novamente surge a possibilidade de confuso e ambigidade. A qual eutansia esto se referindo? Se for tomado apenas o significado literal das palavras quanto a sua origem grega, certamente so antnimos. Se o significado de distansia for entendido como prolongar o sofrimento ele se ope ao de eutansia que utilizado para abreviar esta situao. Porm se for assumido o seu contedo moral, ambas convergem. Tanto a eutansia quanto a distansia so tidas como sendo eticamente inadequadas. Ortotansia: a atuao correta frente a morte. a abordagem adequada diante de um paciente que est morrendo. A ortotansia pode, desta forma, ser confundida com o significado inicialmente atribudo palavra eutansia. A ortotansia poderia ser associada, caso fosse um termo amplamente, adotado aos cuidados paliativos adequados prestados aos pacientes nos momentos finais de suas vidas Eutansia

    52. Mistansia: tambm chamada de eutansia social. Leonard Martin sugeriu o termo mistansia para denominar a morte miservel, fora e antes da hora. Segundo este autor, "dentro da grande categoria de mistansia quero focalizar trs situaes: primeiro, a grande massa de doentes e deficientes que, por motivos polticos, sociais e econmicos, no chegam a ser pacientes, pois no conseguem ingressar efetivamente no sistema de atendimento mdico; segundo, os doentes que conseguem ser pacientes para, em seguida, se tornar vtimas de erro mdico e, terceiro, os pacientes que acabam sendo vtimas de m-prtica por motivos econmicos, cientficos ou sociopolticos. A mistansia uma categoria que nos permite levar a srio o fenmeno da maldade humana". Eutansia

    53. Breve Histrico da Eutansia Diversos povos, como os celtas, por exemplo, tinham por hbito que os filhos matassem os seus pais quando estes estivessem velhos e doentes. Na ndia os doentes incurveis eram levados at a beira do rio Ganges, onde tinham as suas narinas e a boca obstrudas com o barro. Uma vez feito isto eram atirados ao rio para morrerem. Na prpria Bblia tem uma situao que evoca a eutansia, no segundo livro de Samuel. A discusso a cerca dos valores sociais, culturais e religiosos envolvidos na questo da eutansia vem desde a Grcia antiga. Por exemplo, Plato, Scrates e Epicuro defendiam a idia de que o sofrimento resultante de uma doena dolorosa justificava o suicdio. Em Marselha, neste perodo, havia um depsito pblico de cicuta a disposio de todos. Aristteles, Pitgoras e Hipcrates, ao contrrio, condenavam o suicdio. No juramento de Hipcrates consta: "eu no darei qualquer droga fatal a uma pessoa, se me for solicitado, nem sugerirei o uso de qualquer uma deste tipo". Desta forma a escola hipocrtica se j se posicionava contra o que hoje tem a denominao de eutansia e de suicdo assistido. Estas discusses no ficaram restritas apenas a Grcia. Clepatra VII (69aC-30aC) criou no Egito uma "Academia" para estudar formas de morte menos dolorosas.

    54. A discusso sobre o tema, prosseguiu o longo da histria da humanidade, com a participao de Lutero, Thomas Morus (Utopia), David Hume (On suicide), Karl Marx (Medical Euthanasia) e Schopenhauer. No sculo passado, o seu apogeu foi em 1895, na ento Prssia, quando, durante a discusso do seu plano nacional de sade, foi proposto que o Estado deveria prover os meios para a realizao de eutansia em pessoas que se tornaram incompetentes para solicit-la. No sculo XX, esta discusso teve um de seus momentos mais acalorados entre as dcadas de 20 e 40. Foi enorme o nmero de exemplos de relatos de situaes que foram caracterizadas como eutansia, pela imprensa leiga, neste perodo. O Prof. Jimnez de Asa catalogou mais de 34 casos. No Brasil, na Faculdade de Medicina da Bahia, mas tambm no Rio de Janeiro e em So Paulo, inmeras teses foram desenvolvidas neste assunto entre 1914 e 1935. Na Europa, especialmente, muito se falou de eutansia associando-a com eugenia. Esta proposta buscava justificar a eliminao de deficientes, pacientes terminais e portadores de doenas consideradas indesejveis. Nestes casos, a eutansia era, na realidade, um instrumento de "higienizao social", com a finalidade de buscar a perfeio ou o aprimoramento de uma "raa", nada tendo a ver com compaixo, piedade ou direito para terminar com a prpria vida. Breve Histrico da Eutansia

    55. Em 1931, na Inglaterra, o Dr. Millard, props uma Lei para Legalizao da Eutansia Voluntria, que foi discutida at 1936, quando a Cmara dos Lordes a rejeitou. Esta sua proposta serviu, posteriormente, de base para o modelo holands. Durante os debates, em 1936, o mdico real, Lord Dawson, revelou que tinha "facilitado" a morte do Rei George V, utilizando morfina e cocana. O Uruguai, em 1934, incluiu a possibilidade da eutansia no seu Cdigo Penal, atravs da possibilidade do "homicdio piedoso". Esta legislao uruguaia possivelmente seja a primeira regulamentao nacional sobre o tema. Vale salientar que esta legislao continua em vigor at o presente. A doutrina do Prof. Jimnez de Asa, penalista espanhol, proposta em 1925, serviu de base para a legislao uruguaia. Em outubro de 1939 foi iniciado o programa nazista de eutansia, sob o cdigo "Aktion T 4". O objetivo inicial era eliminar as pessoa que tinham uma "vida que no merecia ser vivida". Este programa materializou a proposta terica da "higienizao social". Breve Histrico da Eutansia

    56. Em 1954, o telogo episcopal Joseph Fletcher, publicou um livro denominado "Morals and Medicine", onde havia um captulo com ttulo "Euthanasia: our rigth to die". A Igreja Catlica, em 1956, posicionou-se de forma contrria a eutansia por ser contra a "lei de Deus". O Papa Pio XII, numa alocuo a mdicos, em 1957, aceitou, contudo, a possibilidade de que a vida possa ser encurtada como efeito secundrio a utilizao de drogas para diminuir o sofrimento de pacientes com dores insuportveis, por exemplo. Desta forma, utilizando o princpio do duplo efeito, a inteno diminuir a dor, porm o efeito, sem vnculo causal, pode ser a morte do paciente. Em 1968, a Associao Mundial de Medicina adotou uma resoluo contrria a eutansia. Em 1973, na Holanda, uma mdica geral, Dra. Geertruida Postma, foi julgada por eutansia, praticada em sua me, com uma dose letal de morfina. A me havia feito reiterados pedidos para morrer. Foi processada e condenada por homicdio, com uma pena de priso de uma semana (suspensa), e liberdade condicional por um ano. Neste julgamento foram estabelecidos os critrios para ao do mdico. Breve Histrico da Eutansia

    57. Em 1980, o Vaticano divulgou uma Declarao sobre Eutansia, onde existe a proposta do duplo efeito e a da descontinuao de tratamento considerado ftil. Em 1981, a Corte de Rotterdam revisou e estabeleceu os critrios para o auxlio morte. Em 1990, a Real Sociedade Mdica dos Pases Baixos e o Ministrio da Justia estabeleceram uma rotina de notificao para os casos de eutansia, sem torn-la legal, apenas isentando o profissional de procedimentos criminais. Em 1991, houve uma tentativa frustrada de introduzir a eutansia no Cdigo Civil da Califrnia/EEUU. Neste mesmo ano a Igreja Catlica, atravs de uma Carta do Papa Joo Paulo II aos bispos, reiterou a sua posio contrria ao aborto e a eutansia, destacando a vigilncia que as escolas e hospitais catlicos deveriam exercer na discusso destes temas. Os Territrios do Norte da Austrlia, em 1996, aprovaram uma lei que possibilita formalmente a eutansia. Meses aps esta lei foi revogada, impossibilitando a realizao da eutansia na Austrlia. Breve Histrico da Eutansia

    58. Em 1996, foi proposto um projeto de lei no Senado Federal (projeto de lei 125/96), institundo a possibilidade de realizao de procedimentos de eutansia no Brasil. A sua avaliao nas comisses especializadas no properou. Em maio de 1997 a Corte Constitucional da Colombia estabeleceu que "ningum pode ser responsabilizado criminalmente por tirar a vida de um paciente terminal que tenha dado seu claro consentimento". Esta posio estabeleceu um grande debate nacional entre as correntes favorveis e contrrias. Vale destacar que a Colombia foi o primeiro pas sul-americano a constituir um Movimento de Direito Morte, criado em 1979. Em outubro de 1997 o estado do Oregon, nos Estados Unidos, legalizou o suicdio assistido, que foi interpretado erroneamente, por muitas pessoas e meios de comunicao, como tendo sido autorizada a prtica da eutansia. Em novembro de 2000 a Cmara de Representantes dos Pases Baixos aprovou, com uma parte do plenrio se manifestando contra, uma legislao sobre morte assistida. Esta lei permitir inclusive que menores de idade possam solicitar este procedimento. Falta ainda a aprovao pelo Senado, mas a aprovao dada como certa. Esta lei apenas torna legal um procedimento que j era consentido pelo Poder Judicirio holands. A repercusso mundial foi muito grande com forte posicionamento do Vaticano afirmando que esta lei atenta contra a dignidade humana. Breve Histrico da Eutansia

    59. Eutansia: direito de matar ou direito de morrer O ato de promover a morte antes do que seria de esperar, por motivo de compaixo e diante de um sofrimento penoso e insuportvel, sempre foi motivo de reflexo por parte da sociedade. Agora, essa discusso tornou-se ainda mais presente quando se discute os direitos individuais como resultado de uma ampla mobilizao do pensamento dos setores organizados da sociedade e quando a cidadania exige mais direitos. Alm disso, surgem cada vez mais tratamentos e recursos capazes de prolongar por muito tempo a vida dos pacientes descerebrados, o que pode levar a um demorado e penoso processo de morrer. A medicina atual, na medida em que avana na possibilidade de salvar mais vidas, cria inevitavelmente complexos dilemas ticos que permitem maiores dificuldades para um conceito mais ajustado do fim da existncia humana. Alm disso, "o aumento da eficcia e a segurana das novas modalidades teraputicas motivam tambm questionamentos quanto aos aspectos econmicos, ticos e legais resultantes do emprego exagerado de tais medidas e das possveis indicaes inadequadas de sua aplicao". O cenrio da morte e a situao de paciente terminal so as condies que ensejam maiores conflitos neste contexto, levando em conta os princpios, s vezes antagnicos, da preservao da vida e do alvio do sofrimento.

    60. Desse modo, disfarada, enfraquecida e desumanizada pelos rigores da moderna tecnologia mdica, a morte vai mudando sua face ao longo do tempo. A cada dia que passa maior a cobrana de que possvel uma morte digna e as famlias j admitem o direito de decidir sobre o destino de seus enfermos insalvveis e torturados pelo sofrimento fsico, para os quais os meios teraputicos disponveis no conseguem atenuar. O mdico vai sendo influenciado a seguir os passos dos moribundos e a agir com mais "sprit de finesse", orientado por uma nova tica fundada em princpios sentimentais e preocupada em entender as dificuldades do final da vida humana; uma tica necessria para suprir uma tecnologia dispensvel. Neste instante, possvel que a medicina venha rever seu iderio e suas possibilidades, tendo a "humildade" de no tentar "vencer o invencvel". Apesar do avano da cincia, se auscultarmos mais atentamente a realidade sociolgica atual nas comunidades de nossa convivncia cultural, certamente vamos entender a complexidade e a profundeza do tema. Casabona, sobre isso, afirma que "tem de deixar-se assentado que a realidade se apresenta com uma complexidade muito superior, que dificulta a valorizao da oportunidade da deciso a tomar. Afirmaes como incurvel, proximidade de morte, perspectiva de cura, prolongamento da vida, etc., so posies muito relativas e de uma referncia em muitas ocasies, pouco confiveis. Da a delicadeza e a escrupulosidade necessrias na hora de enfrentar-se com o caso concreto". Eutansia: direito de matar ou direito de morrer

    61. O "direito de matar" ou o "direito de morrer" sempre teve em todas as pocas seus mais extremados defensores. Na ndia de antigamente, os incurveis eram jogados no Ganges, depois de se lhes vedar a boca e as narinas com a lama sagrada. Os espartanos, conta Plutarco em Vidas Paralelas, do alto do monte Taijeto, lanavam os recm-nascidos deformados e at ancios, pois "s viam em seus filhos futuros guerreiros que, para cumprirem tais condies deveriam apresentar as mximas condies de robustez e fora". Os Brmanes eliminavam os velhos enfermos e os recm-nascidos defeituosos por consider-los imprestveis aos interesses do grupo . Em Atenas, o Senado tinha o poder absolutos de decidir sobre a eliminao dos velhos e incurveis, dando-lhes o conium maculatum bebida venenosa, em cerimnias especiais. Na Idade Mdia, oferecia-se aos guerreiros feridos um punhal muito afiado, conhecido por misericrdia, que lhes servia para evitar o sofrimento e a desonra. O polegar para baixo dos csares era uma indulgente autorizao morte, permitindo aos gladiadores feridos evitarem a agonia e o ultraje. Eutansia: direito de matar ou direito de morrer

    62. H at quem afirme que o gesto dos guardas judeus de darem a Jesus uma esponja embebida em vinagre, antes de constituir ato de zombaria e crueldade, teria sido uma maneira piedosa de amenizar seu sofrimento, pois o que lhe ofereceram, segundo consta, fora simplesmente o vinho da morte, numa atitude de extrema compaixo. Segundo Dioscorides, esta substncia "produzia um sono profundo e prolongado, durante o qual o crucificado no sentia nem os mais cruentos castigos, e por fim caa em letargo passando morte insensivelmente" Assim admitida na antiguidade, a eutansia s foi condenada a partir do judasmo e do cristianismo, em cujos princpios a vida tinham o carter sagrado. No entanto, foi a partir do sentimento que cerca o direito moderno que a eutansia tomou carter criminoso, como proteo irrecusvel do mais valioso dos bens: a vida. At mesmo nos instantes mais densos, como nos conflitos internacionais, quando tudo parece perdido, face as condies mais precrias e excepcionais, ainda assim o bem da vida de tal magnitude que a conscincia humana procura proteg-la contra a insnia, criando regras para impedir a prtica de crueldades irreparveis. Outras vezes, a cincia, de forma desesperada, intima os cientistas do mundo inteiro a se debruar sobre as mesas de seus laboratrios, na procura dos meios salvadores da vida. Eutansia: direito de matar ou direito de morrer

    63. Tipos de Eutansia Atualmente a eutansia pode ser classificada de vrias formas, de acordo com o critrio considerado. Quanto ao tipo de ao: Eutansia ativa: o ato deliberado de provocar a morte sem sofrimento do paciente, por fins misericordiosos. Eutansia passiva ou indireta: a morte do paciente ocorre, dentro de uma situao de terminalidade, ou porque no se inicia uma ao mdica ou pela interrupo de uma medida extraordinria, com o objetivo de minorar o sofrimento. Eutansia de duplo efeito: quando a morte acelerada como uma conseqencia indireta das aes mdicas que so executadas visando o alvio do sofrimento de um paciente terminal. Quanto ao consentimento do paciente: Eutansia voluntria: quando a morte provocada atendendo a uma vontade do paciente. Eutansia involuntria: quando a morte provocada contra a vontade do paciente. Eutansia no voluntria: quando a morte provocada sem que o paciente tivesse manifestado sua posio em relao a ela. Esta classificao, quanto ao consentimento, visa estabelecer, em ltima anlise, a responsabilidade do agente, no caso o mdico. Esta discusso foi proposta por Neukamp, em 1937.

    64. Historicamente, a palavra eutansia admitiu vrios significados. Destacamos, a ttulo de curiosidade, a classificao proposta na Espanha, por Ricardo Royo-Villanova, em 1928: Eutansia sbita: morte repentina; Eutansia natural: morte natural ou senil, resultante do processo natural e progressivo do envelhecimento; Eutansia teolgica: morte em estado de graa; Eutansia estica: morte obtida com a exaltao das virtudes do estoicismo; Eutansia teraputica: faculdade dada aos mdicos para propiciar um morte suave aos enfermos incurveis e com dor; Eutansia eugnica e econmica: supresso de todos os seres degenerados ou inteis (sic); Eutansia legal: aqueles procedimentos regulamentados ou consentidos pela lei. Tipos de Eutansia

    65. No Brasil, tambm em 1928, o Prof. Ruy Santos, na Bahia props que a eutansia fosse classificada em dois tipos, de acordo com quem executa a ao: Eutansia-homicdio: quando algum realiza um procedimento para terminar com a vida de um paciente. Eutansia-homicdio realizada por mdico; Eutansia-homicdio realizada por familiar; Eutansia-suicdio: quando o prprio paciente o executante. Esta talvez seja a idia precursora do Suicdio Assistido. Tipos de Eutansia

    66. Finalmente, o Prof. Jimnez de Asa, em 1942, props que existem, a rigor, apenas trs tipos: Eutansia libertadora, que aquela realizada por solicitao de um paciente portador de doena incurvel, submetido a um grande sofrimento; Eutansia eliminadora, quando realizada em pessoas, que mesmo no estando em condies prximas da morte, so portadoras de distrbios mentais. Justifica pela "carga pesada que so para suas famlias e para a sociedade"; Eutansia econmica, seria a realizada em pessoas que, por motivos de doena, ficam inconscientes e que poderiam, ao recobrar os sentidos sofrerem em funo da sua doena. Estas idias bem demonstram a interligao que havia nesta poca entre a eutansia e a eugenia, isto , na utilizao daquele procedimento para a seleo de indivduos ainda aptos ou capazes e na eliminao dos deficientes e portadores de doenas incurveis. Tipos de Eutansia

    67. Declarao sobre Eutansia World Medical Association Madrid/Espanha 1987 Eutansia, que o ato de deliberadamente terminar com a vida de um paciente, mesmo com a solicitao do prprio paciente ou de seus familiares prximos, eticamente inadequada. Isto no impede o mdico de respeitar o desejo do paciente em permitir o curso natural do processo de morte na fase terminal de uma doena. Quando a Holanda, em fevereiro de 1993, instituiu a nova legislao, que permite que o mdico realize eutansia ativa, sob certas condies, a Associao Mundial de Medicina, no dia seguinte, chamou a ateno para o texto desta Declarao, que foi aprovada, por unanimidade, na 39a. Assemblia Mundial de Medicina.

    68. Caso Debbie eutansia ativa Um residente de Ginecologia, que estava de planto em um grande hospital privado norte-americana, foi chamado a meia-noite, para atender uma paciente de 20 anos, em estgio terminal, com cncer de ovrio. A paciente no respondeu quimioterapia e estava recebendo apenas medidas de suporte. Ela estava acompanhada pela me quando o mdico chegou. H dois dias que no conseguia comer ou dormir. Estava com 34 kg de peso corporal e com vmitos frequentes. "Debbie" disse ao mdico, que no a conhecia at este momento, apenas a seguinte frase: "terminemos com isto". O mdico foi at a sala de enfermagem e preparou 20mg de morfina. Voltou ao quarto e disse s duas mulheres que iria dar uma injeo que possibilitaria a Debbie descansar e dizer adeus. A paciente nada disse, nem sua me. Em 4 minutos a paciente morreu. A me se manteve erguida e pareceu aliviada.

    69. Crtica ao Caso Debbie A publicao do Caso Debbie no JAMA, de 1988, gerou uma enorme discusso a respeito de duas questes ticas importantes: a preservao do nome do autor do relato e a eutansia ativa feita sem maiores critrios. Annimo. Its over, Debbie. JAMA 1988;259(2):272. O direito do editor da revista em publicar este tipo de relato, mantendo o anonimato do autor e sem um editorial que comentasse o assunto ou repreedesse a conduta do mdico foi duramente criticado em diversos artigos. Vrios bioeticistas, entre eles Edmond Pellegrino, levantaram a questo da violao de normas ticas e legais praticadas pelo residente. Estes autores afirmaram que o debate sobre a eutansia ativa atinge o centro moral da Medicina. Os mdicos devem repudiar aqueles profissionais que intencional e ativamente matam seus pacientes. Gaylin W, Kass LR, Pellegrino ED, Siegler M. Doctors must not kill. JAMA 1988;259(14):2139-2140. Kenneth Vaux, em outro artigo, rebateu a interpretao de que este caso seria um exemplo de eutansia por duplo-efeito. Vaux acredita que a eutansia, por princpio, deve ser proscrita. Questionou, contudo, que apesar do objetivo da Medicina ser salvar e preservar a vida e nunca causar danos ou a morte de forma intencional, em casos excepcionais, a eutansia pode ser, certamente, tolerada. Vaux KL. Debbie's dying: mercy killing and the good death. JAMA 1988; 259(14):2140-2141. Caso Debbie eutansia ativa

    70. Eutansia - Alemanha Nazista 1939-1941 Em outubro de 1939, a Alemanha Nazista implantou a "Aktion T 4", que era um programa de eliminao de recm-nascidos e crianas pequenas, at 3 anos, que tinham uma "vida que no merecia ser vivida". Os mdicos e parteiras tinham o dever de notificar a autoridade sanitria de casos de retardo mental, deformidades fsicas e outras condies limitantes. Uma junta mdica de trs profissionais examinava cada caso e a eliminao somente era realizada quando houvesse unanimidade. O programa logo se extendeu para adultos e velhos. Os pacientes que deveriam ser notificados eram portadores de esquizofrnia, epilepsia, desordens senis, paralisias que no respondiam a tratamento, sfilis, retardos mentais, encefalite, doena de Huntington e outras patologias neurolgicas. Eram tambm includos os pacientes internados a mais de 5 anos ou criminalmente insanos. Foram acrescidos os critrios de no possuir cidadania alem, ou ascendncia alem, discriminando especialmente negros, judeus e ciganos.

    71. Eutansia - Alemanha Nazista 1939-1941 Em seis centros de extermnio foram executadas cerca de 100.000 pessoas em menos de dosi anos que o Programa foi mantido. Um sermo do bispo catlico Clemens von Galen, feito em 3 de agosto de 1941 denunciou de forma contundente e definitiva este extermnio. Em 23 de agosto, Hitler suspendeu a Aktion T 4, devido as repercusses deste sermo. A tecnologia de extermnio desenvolvida neste Programa foi utilizada nos campos de concentrao para a eliminao em massa, no mais de doentes, mas com finalidade de "purificao racial". A designao Eutansia para esse tipo de procedimento incorreta, pois no havia o interesse de minorar o sofrimento de uma pessoa capaz e informada de sua condio de sade.

    72. Eutansia - Austrlia Nos Territrios do Norte da Austrlia esteve em vigor, de 1o. de julho de 1996 a 24 de maro de 1997, a primeira lei que autorizou a eutansia ativa, que recebeu a denominao de Lei dos Direitos dos Pacientes Terminais. A lei foi derrubada por uma pequena diferena de votos (38 a 34), apesar das pesquisas de opinio referirem que 74% dos australianos serem contra esta revogao. Esta lei estabelecia inmeros critrios e precaues at permitir a realizao do procedimento. Estas medidas, na prtica, inibiam as solicitaes intempestivas ou sem base em evidncias clinicamente comprovveis. Isto foi possvel de ser comprovado no primeiro paciente a obter autorizao foi Robert Dent, que morreu em 22/09/96.

    73. Eutansia - Austrlia Critrios estabelecidos pela Lei dos Direitos dos Pacientes Terminais (1996): 1) Paciente faz a solicitao a um mdico. 2) O mdico aceita ser seu assistente. 3) O paciente deve ter 18 anos no mnimo. 4) O paciente deve ter uma doena que no seu curso normal ou sem a utilizao de medidas extraordinrias acarretar sua morte. 5) No deve haver qualquer medida que possibilite a cura do paciente. 6) No devem existir tratamentos disponveis para reduzir a dor, sofrimento ou desconforto. 7) Deve haver a confirmao do diagnstico e do prognstico por um mdico especialista. 8) Um psiquiatra qualificado deve atestar que o paciente no sofre de uma depresso clnica tratvel. 9) A doena deve causar dor ou sofrimento. 10) O mdico deve informar ao paciente todos os tratamentos disponveis, inclusive tratamentos paliativos. 11) As informaes sobre os cuidados paliativos devem ser prestadas por um mdico qualificado nesta rea. 12) O paciente deve expressar formalmente seu desejo de terminar com a vida.

    74. Eutansia - Austrlia 13) O paciente deve levar em considerao as implicaes sobre a sua famlia. 14) O paciente deve estar mentalmente competente e ser capaz de tomar decises livre e voluntariamente. 15) Deve decorrer um prazo mnimo de sete dias aps a formalizao do desejo de morrer. 16) O paciente deve preencher o certificado de solicitao. 17) O mdico assistente deve testemunhar o preenchimento e a assinatura do Certificado de Solicitao. 18) Um outro mdico deve assinar o certificado atestando que o paciente estava mentalmente competente para livremente tomar a deciso. 19) Um interprete deve assinar o certificado, no caso em que o paciente no tenha o mesmo idioma de origem dos mdicos. 20) Os mdicos envolvidos no devem ter qualquer ganho financeiro, alm dos honorrios mdicos habituais, com a morte do paciente. 21) Deve ter decorrido um perodo de 48 horas aps a assinatura do cretificado. 22) O paciente no deve ter dado qualquer indicao de que no deseja mais morrer. 23) A assistncia ao trmino voluntrio da vida pode ser dada.

    75. Caso Robert Dent Roberto Dent, 66 anos, carpinteiro, natural e residente em Darwin/Austlia, com cncer de prstata desde 1991, estava anmico e emagreceu 25kg, foi a primeira pessoa no mundo a obter uma autorizao para eutansia com amparo legal. Morreu, aps conversar longamente e almoar com sua esposa, utilizando injeo letal no dia 22/09/96.

    76. Eutansia - Blgica A Blgica legalizou a eutansia em 16 de maio de 2002. A sua vigncia iniciou em 22 de setembro de 2002. A lei belga foi derivada de uma diretriz emanada pelo Comit Consultivo Nacional de Biotica daquele pas, Diferentemente da lei da Holanda que surgiu de uma longa trajetria de casos, ou seja, de uma jurisprudencia prvia, a lei belga surgiu de um debate sobre a sua necessidade e adequao. A lei belga mais restritiva que a holandesa. Uma diferena fundamental a garantia do anonimato presente na legislao belga. Outra a excluso da possibilidade de menores de 18 anos solicitarem este tipo de procedimento. Na Blgica dada a garantia de que uma pessoa que no tenha recursos possa ter a sua disposio os meios fornecidos pelo Estado para a realizao da eutansia. Uma situao prevista a possibilidade de solicitao de eutansia por uma pessoa que no esteja em estado terminal. neste caso ser necessria a participao de um terceiro mdico para dar a sua opinio sobre o caso. Todos os procedimentos so revistos por um comit especial que acvalia se os critrios legais foram efetivamente cumpridos.

    77. Eutansia no Brasil No Brasil a eutansia considerada como sendo homicdio. Est tramitando na Senado Federal, um projeto de lei 125/96, elaborado desde 1995, estabelecendo critrios para a legalizao da "morte sem dor". O projeto prev a possibilidade de que pessoas com sofrimento fsico ou psquico possam solicitar que sejam realizados procedimentos que visem a sua prpria morte. A autorizao para estes procedimentos ser dada por uma junta mdica, composta por 5 membros, sendo dois especialistas no problema do solicitante. Caso o paciente esteja impossibilitado de expressar a sua vontade, um familiar ou amigo poder solicitar Justia tal autorizao. O projeto de lei bastante falho na abordagem de algumas questes fundamentais, tais como o estabelecimento de prazos para que o paciente reflita sobre sua deciso, sobre quem ser o mdico responsvel pela realizao do procedimento que ir causar a morte do paciente, entre outros itens. Tambm est tramitando o Anteprojeto de Lei que altera os dispositivos do Cdigo Penal e d outras providncias, legislando sobre a questo da eutansia em dois itens do artigo 121.

    78. Homicdio Art. 121. Matar algum: Pena - Recluso, de seis a vinte anos. ... Eutansia Pargrafo 3o. Se o autor do crime agiu por compaixo, a pedido da vtima, imputvel e maior, para abreviar-lhe o sofrimento fsico insuportvel, em razo de doena grave: Pena - Recluso, de trs a seis anos. Excluso de Ilicitude Pargrafo 4o. No constitui crime deixar de manter a vida de algum por meio artificial, se previamente atestada por dois mdicos, a morte como iminente e inevitvel, e desde que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cnjuge, companheiro ou irmo. Eutansia no Brasil

    79. A redao dos pargrafos deixa margem a interpretaes diversas. Alguns autores esto denominando, equivocadamente, a situao prevista no pargrafo 4o. de Ortotansia. e no atinge a questo principal que a de estabelecer critrios uniformes de morte torcica ou enceflica para todas as situaes, e no apenas para a doao de rgos, neste ltimo caso. Esta alterao poderia levar em conta alguns itens das legislaes vigentes no Uruguay e na Holanda. Nesteas duas leis ocorre a exonerao de castigo, sem deixar de caracterizar o ato como o de matar algum. Estas propostas tem como base as propostas de Jimnes de Asua, feitas na dcada de 1920. A legislao da Austrlia, que no est mais vigindo, tambm poderia orientar, principalmente no que se refere aos condicionantes do processo Eutansia no Brasil

    80. Caso Eutansia em So Paulo Na publicao "Vidas em Revista", de 08 de maro de 2004, foi publicada uma reportagem onde um cirurgio, Carlos Alberto de Castro Cotti, de So Paulo, relatou ter realizado vrias eutansias, inclusive involuntrias, em seus pacientes, desde 1959. 1o Relato - 1959: Um paciente com ictercia, que no conseguia se alimentar e recebia alimentao "artificialmente". O paciente tinha dores e recebia morfina. "Era um absurdo mant-lo vivo naquelas condies", afirmou o cirurgio. 2o Relato - 1964: Um paciente com metstases cerebrais, pulmonares e intestinais generalizadas. Quando as metstases sseas o atingiram a dor era "violenta". 3o Relato - sem data especificada: Um paciente com carcinomatose, com bloqueio de rim. "Foi muito triste porque era meu amigo, tinha 52 ou 54 anos."

    81. 4o Relato - sem data especificada: Uma paciente, com idade entre 65 e 68 anos, foi operada quatro vezes em dois anos. Na primeira vez foi feita uma jejunostomia. No incio ela tinha 70 kg, aps a quarta cirurgia, quando teve uma perfurao intestinal devida a carcinoma, teve uma peritonite, j estava com apenas 25 kg. Nesta ocasio o cirurgio da paciente solicitou ao mdico que relatou o fato, que fizesse uma injeo de "M1" (soluo a base de fenergan, morfina e outras substncias) na paciente. Isto foi feito na prpria residncia da paciente, aps ter sido comunicado aos filhos. "Eu fui buscar a medicao e ns dois colocamos no soro. Ficamos aguardando, conversando, por que ns resolvemos que deveramos estender o mais que pudssemos o sono, porque a paciente estava muito consciente. E foi feito." Uma das reprteres perguntou se a paciente sabia a havia concordado com o procedimento. A resposta foi a seguinte: "Ela sabia que no podia mais ser operada, mas no sabia que ia receber o "M1". Quem decidiu isso foi a famlia." Caso Eutansia em So Paulo

    82. Caso Eutansia no Rio de Janeiro Na publicao "Vidas em Revista", de 08 de maro de 2004, foi publicada uma reportagem onde h o relato da eutansias realizadas no hospital Salgado Filho, no Rio de Janeiro, pelo auxiliar de enfermagem Edson Isidoro Guimares, em 1999. Ele afirmava que fazia isto por compaixo, para aliviar o sofrimento dos pacientes, que podiam ser jovens ou velhos. O mtodo utilizado consistia na injeo de cloreto de potssio ou no desligamento do equipamento que fornecia oxignio aos pacientes. Foram apuradas 153 ocorrncias deste tipo em seus plantes, com as mortes ocorrendo entre as duas e as quatro horas da manh. Destas, quatro foram comprovadas e assumidas pelo auxiliar de enfermagem, que foi julgado e condenado a 76 anos de priso, em 19/02/2000. A sua pena j foi reduzida duas vezes, primeiro para 69 anos e depois para 31 anos e oito meses. Havia o envolvimento de empresas funerrias que pagaram entre 40 e 60 dlares norte-americanos por paciente encaminhado.

    83. Eutansia - Estados Unidos Nos Estrados Unidos a eutansia no permitida por lei. A justia americana possibilitou algumas outras situaes que envolvem o final de vida como a interrupo de tratamento que apenas prolongue o processo de morrer de pacientes e o suicdio assistido. Em 1990, no caso Nancy Cruzan a justia do estado de Missouri assegurou o direito dos familiares solicitarem a interrupo de tratamentos que apenas prolonguem a morte de uma paciente em estado vegetativo persistente. Em 1991, foi feita uma proposio de alterao do Cdigo Civil da Califrnia/EEUU (Proposio 161), no aceita em um plebiscito, de que uma pessoa mentalmente competente, adulta, em estado terminal poderia solicitar e receber uma ajuda mdica para morrer. O objetivo seria o de permitir a morte de maneira indolor, humana e digna. O mdicos teriam imunidade legal destes atos. Em abril de 1996, o juiz Stephen Reinhardt, do 9o, Tribunal de Apelao de Los Angeles Califrnia, estabeleceu que a Constituio Americana garante o direito ao suicdio assistido a todo paciente terminal.

    84. Caso Nancy Cruzan retirada de tratamento Em 11 de janeiro de 1983, Nancy Cruzan, de 25 anos, casada, perdeu o controle de seu carro quando viajava no interiro do estado de MIssouri;EUA. O carro capotou e ela foi encontrada voltada com rosto para baixo em um crrego, sem respirao ou batimento cardaco detectvel. Os profissionais de emergncia que a atenderam foram capazes de recuperar as funes respiratria e cardaca, sendo a paciente transportada inconsciente para o hospital. Um neurocirurgio diagnosticou a possibilidade de dano cerebral permanente devido a falta de oxignio. O perodo de tempo de anxia foi estimado em 10 a 12 minutos. Em mdia se estima que ocorram danos cerebrais permanentes com anxia de 6 minutos ou mais. A paciente ficou em coma por trs semanas. O quadro evoluiu para um estado de inconscincia onde a paciente podia se alimentar parcialmente por via oral. Com a finalidade de facilitar a sua alimentao, foi introduzida uma sonda de alimentao. O seu marido autorizou este procedimento. Em outubro de 1983, ou seja, dez meses aps o acidente, ela foi internada em um hospital pblico. Todas as tentativas de reabilitao foram mal sucedidas, demonstrando que ela no teria possibilidade de recuperar a vida de relao. Os seus pais, que tambm eram considerados como seus representantes legais, em conjunto com o esposo, solicitaram ao hospital que retirassem os procedimentos de nutrio e hidratao assistida, ou seja a sonda que havia sido colocada. Os mdicos e a instituio se negaram a atender esta demanda sem autorizao judicial.

    85. Os pais entraram na justia do estado do Missouri solicitando esta autorizao em junho de 1989. Um representante legal foi indicado para atuar durante o julgamento. O tribunal, em junho de 1990, aps realizar audincias, ordenou instituio que atendesse a demanda da famlia. Esta deciso se baseou em trs argumentos bsicos: no diagnstico, na previso legal desta demanda e na manifestao prvia da vontade pessoal da paciente. O diagnstico de dano cerebral permanente e irreversvel, em conseqncia do longo perodo de anxia, foi confirmado e no questionado. A lei do estado do Missouri e da Constituio norte-americana permitem que uma pessoa no estado da paciente pode recusar ou solicitar a retirada de "procedimentos que prolonguem a morte". considerando que ela, aos vinte anos, tinha manifestado em uma conversa sria com uma colega de quarto, que se estivesse doente ou ferida, ela no gostaria de ser mantida viva, salvo que pudesse ter pelo menos metade de suas capacidades normais. Esta posio sugeriu que ela no estaria de acordo com a manuteno da hidratao e da nutrio nas suas condies atuais. No tmulo de Nancy Cruzan consta a seguinte indicao: Nascida em 20 de julho de 1957 Partiu em 11 de janeiro de 1983 Em paz em 26 de dezembro de 1990 Caso Nancy Cruzan retirada de tratamento

    86. Eutansia no Canad TORONTO. 2/02/98. O fazendeiro canadense Robert Latimer, de 44 anos, foi condenado a dois anos de priso ontem por causar a morte de sua filha Tracy, de 12 anos. Latimer havia sido condenado priso perptua, mas a sentena foi revista. Ele virou smbolo do debate sobre a eutansia ao confessar ter provocado a morte de sua filha, que sentia fortes dores devido a uma paralisia cerebral. Foi a primeira condenao de um assassino pena mnima pela Justia canadense. Depois de um ano na priso, Latimer poder cumprir o outro ano em liberdade condicional, em sua fazenda. O juiz disse que a priso perptua seria uma punio cruel e incomum. Latimer fora condenado em 1994 por homicdio em segundo grau, sem direito a recorrer da sentena durante dez anos. O veredito foi, porm, revisto pela Suprema Corte porque a polcia havia questionado jurados sobre a atitude deles diante da morte por piedade, o que ilegal. Ms passado, houve uma segunda condenao por homicdio em segundo grau, em que o juri recomendou tolerncia em relao ao ru. No Canad, juzes tm autoridade para rever sentenas se acharem que estas no esto de acordo com o cdigo de direitos humanos do pas. Enquanto sua mulher e seus outros trs filhos estavam numa igreja, Latimer levou Tracy para fora de casa durante uma nevasca e a observou morrer em sete minutos. Tracy no podia andar, falar ou comer sozinha, pesava menos de 18 quilos e tinha idade mental de trs meses. O caso acirrou debates entre defensores da eutansia e grupos que lutam por direitos de pessoas invlidas. A deciso de ontem abrir um debate sobre a lei canadense.

    87. Eutansia - Colombia Em 15 de maio de 1997 A Corte Constitucional da Colombia julgou uma demanda judicial contra o artigo 326 do Cdigo Penal Colombiano. Esta demanda queria considerar a possibilidade de ser realizado homicdio por misericrdia, retomando a proposta do jurista Jimnez de Asa. A Colombia o nico pas da Amrica Latina, ao que se tem conhecimento, a possuir um forte Movimento pelo Direito a Morrer com Dignidade, criado em 1979 por Beatriz Kopp de Gomez. Esta senhora teve como motivao a morte de um parente com cncer cerebral. Oseu Movimento j auxiliou mais de 10000 pessoas na Colombia a elaborarem documentos de vontades antecipadas ("living will") sobre o uso ou no de terapias de suporte vital. Omagistrado que propos a discusso, Carlos Gaviria, ateu e defensor da eutansia. Ele aceita que o mdico pode terminar com a vida de um paciente que esteja em intenso sofrimento. O juz Jorge Arango propos que a liberdade o direito maior, a vida sem liberdade no tem sentido. Outro juz, Eduardo Cifuentes, propos que a liberdade e a vida no se opem. Acrescentou que esta proposta somente opderia ser levada a cabo em pacientes terminais, plenamente informados sobre sua condio de sade. Os demais juzes - Alexander Martinez, Fabio Moro e Antonio Barrera - acompanharam o voto dos juzes Jorge Arango e Eduardo Cifuentes, de apoio proposta de Carlos Gaviria. Desta forma, a possibilidade de no ser processado por homicdio, quando for misericordioso, foi aprovada do 6 votos contra 3.

    88. Eutansia - Colombia Em 29 de maio de 1997 os seis juzes que aprovaram a proposta se reuniram para o texto final da sentena. O juz Cifuentes discordou do texto aprovado. Este posicionamento abriu a possibilidade para a anulao de todo o processo. O Congresso Colombiano ainda tem que regulamentar a proposta que despenaliza o homicdio misericordioso. A rigor a Colombia no est legalizando a Eutansia, mas sim seguindo o exemplo do Uruguay e da Holanda. A nica proposta que legalizava a Eutansia foi a que vigorou na Austrlia, mas atualmente foi revogada. Na Colombia existe uma forte influncia da Igreja Catlica na sociedade. Isto tem gerado inmeras manifestaes em contrrio ao que foi aprovado na Corte Constitucional.

    89. Eutansia - Espanha Na dcada de 1920, a Espanha foi um dos primieros pases a discutir a questo da regulamentao da eutansia. Por influncia do Dr. Jimnez de Asa, famoso penalista espanhol, foi estudada a proposta de dar o status de "homicdio piedoso" eutansia, isto , no descaracterizar o delito, mas impedindo a punio do agente, desde que o mesmo tenha bons antecedentes. As outras condies seriam as de haver motivo de piedade no ato e splica reiterada da vtima para a sua realizao. Este modelo foi proposto e nunca implantado na Espanha. Serviu, contudo, de base para as legislaes do Uruguay e da Holanda sobre eutansia. Na Espanha a eutansia e o suicdio assistido constituem-se em crimes. O auxlio a uma pessoa que deseja se suicidar pode ter uma pena de seis meses a seis anos de priso. O caso Ramn Sampedro, que solicitou justia espanhola, durante cinco anos, o direito de morrer, devido a tetraplegia que o acometia por mais de 20 anos, teve um desfecho em janeiro de 1998. Nesta data este senhor foi auxiliado por algumas pessoas a morrer, caracterizando uma eutansia voluntria ativa, apesar de toda a legislao contrria vigente.

    90. Ramn Sampedro era um espanhol, tetraplgico desde os 26 anos, que solicitou justia espanhola o direito de morrer, por no mais suportar viver. Ramn Sampedro permaneceu tetraplgico por 29 anos. A sua luta judicial demorou cinco anos. O direito eutansia ativa voluntria no lhe foi concedido, pois a lei espanhola caracterizaria este tipo de ao como homicdio. Com o auxlio de amigos planejou a sua morte de maneira a no incriminar sua famlia ou seus amigos. Em novembro de 1997, mudou-se de sua cidade, Porto do Son/Galcia-Espanha, para La Corua, 30 km distante. Tinha a assistncia diria de seus amigos, pois no era capaz de realizar qualquer atividade devido a tetraplegia. No dia 15 de janeiro de 1998 foi encontrado morto, de manh, por uma das amigas que o auxiliava. A necropsia indicou que a sua morte foi causada por ingesto de cianureto. Ele gravou em vdeo os seus ltimos minutos de vida. Nesta fita fica evidente que os amigos colaboraram colocando o copo com um canudo ao alcance da sua boca, porm fica igualmente documentado que foi ele quem fez a ao de colocar o canudo na boca e sugar o contedo do copo Caso Ramn Sampedro Suicdio Assistido

    91. A repercusso do caso foi mundial, tendo tido destaque na imprensa como morte assistida. A amiga de Ramn Sampedro foi incriminada pela polcia como sendo a responsvel pelo homicdio. Um movimento internacional de pessoas enviou cartas "confessando o mesmo crime". A justia, alegando impossibilidade de levantar todas as evidncias, acabou arquivando o processo. A questo do suicdio em pacientes com leses medulares j foi estudada epidemiologicamente, evidenciando um aumento em relao populao em geral. Inmeros outros casos, em diferentes locais do mundo tem trazido este tema discusso, porm sempre com alguma confuso ou ambigidade entre os conceitos de suicdio assistido e eutansia. Em 2003 foi rodado um filme espanhol sobre este caso, com o diretor espanhol Alejandro Amenbar. O ttulo do filme Mar Adentro. O diretor caracterizou o seu filme como sendo "una visin de la muerte desde la vida, desde lo cotidiano, lo natural, desde un lado muy luminoso". Caso Ramn Sampedro Suicdio Assistido

    92. Eutansia - Frana O cdigo penal francs diferencia a eutansia ativa da passiva. A eutansia ativa considerada homicdio, enquanto que a passiva considerada como omisso de atendimento. Em 26/01/1999, foi apresentado o projeto de lei 166 no Senado Francs que estabelece a despenalizao da eutansia. Esta lei possibilitaria a utilizao de diretivas avanadas na Frana, ou seja, a possibilidade do paciente deixar por escrito quais as medidas que julga aceitvel para a conduo de seu caso. Era uma proposta semelhante a da Holanda.

    93. Caso Vincent Humbert Eutansia Ativa Voluntria Vincent Humbert, um jovem bombeiro voluntrio de 20 anos teve um grave acidente automobilstico em uma estrada francesa no dia 24 de setembro de 2000. Ele ficou em coma por nove meses. Posteriormente, foi constatado que ele havia ficado tetraplgico, cego e surdo. O nico movimento que ainda mantinha era uma leve presso com o polegar direito. Atravs destes movimentos conseguia se comunicar com a sua me. A comunicao, ensinada pelos profissionais de sade do hospital, era feita com uma pessoa soletrando o alfabeto e ele pressionava com o polegar quando queria utilizar esta letra. Desta forma, conseguia soletrar as palavras. Desde que conseguiu se fazer entender, solicitava os mdicos praticassem a eutansia, como forma de terminar com o sofrimento que estava tendo, pois o mesmo, segundo seu depoimento, era insuportvel. Os mdicos recusaram-se a realiz-la, pois na Frana a eutansia ilegal. Ele tambm solicitou a sua me que fizesse o procedimento. "Meu filho me diz todo dia: 'Me, no consigo mais suportar esse sofrimento. Eu imploro a voc, ajude-me'. O que voc faria? Se tiver de ir para a priso, irei."

    94. Ele fez inmeras solicitaes, inclusive ao prprio presidente francs, atravs de uma carta, no sentido de dar uma exceo legal para o seu caso. O argumento de que o presidente francs tem a prerrogativa de indultar prisioneiros, simetricamente poderia isentar de culpa quem o matasse por compaixo. A frase que encaminhou ao presidente Jacques Chirac, em dezembro de 2002, foi a seguinte: "A lei d-lhe o direito de indultar, eu peo-lhe o direito de morrer". Ele terminou a sua carta com a frase: "O senhor a minha ltima chance"..A resposta do presidente, aps alguns contatos, inclusive com o prprio Vincent, por telefone, foi negativa e acompanhada de uma recomendao de que o jovem deveria "retomar o gosto pela vida". Nesta poca foi feita uma pesquisa de opinio na Frana sobre a questo do suicdio assistido que resultou em 88% de aprovao pela populao, mas no da eutansia. Vale destacar que esta solicitao no teria como ser enquadrada como suicdio assistido, mas sim como eutansia ativa voluntria. Caso Vincent Humbert Eutansia Ativa Voluntria

    95. Vincent escreveu um livro, de 188 pginas, intitulado "Peo-vos o direito de morrer" (Je vous demande le droit de mourir) lanado pela editora Michel Lafon, em 25 de setembro de 2003. Neste livro argumenta o seu pedido e termina dizendo: "A minha me deu-me a vida, espero agora dela que me oferea a morte. (...) No a julguem. O que ela fez para mim certamente a mais bela prova de amor do mundo", Marie Humbert, me de Vincent, de 48 anos, foi considerada por todos como sendo uma me admirvel, que se dedicou integralmente aos cuidados do filho, tendo inclusive se mudado de cidade. No final da tarde de quarta-feira, 24 de setembro de 2003, Marie estava sozinha com o seu filho no quarto do Centre Hlio-marin de Berck-sur-Mer, na costa norte da Frana. Nesta ocasio administrou uma alta dose de barbitricos atravs da sonda gstrica. Este procedimento tinha sido combinado com seu filho, que no queria estar vivo quando o seu livro fosse lanado, o que ocorreria no dia seguinte. "Eu nunca verei este livro porque eu morri em 24 de setembro de 2000 [...]. Desde aquele dia, eu no vivo. Me fazem viver. Sou mantido vivo. Para quem, para que, eu no sei. Tudo o que eu sei que sou um morto-vivo, que nunca desejei esta falsa morte", Caso Vincent Humbert Eutansia Ativa Voluntria

    96. A equipe mdica detectou a deteriorao do quadro de sade do paciente e interveio, fazendo manobras de reanimao. O paciente ficou em coma profundo, vindo a falecer na manh do dia 27 de setembro de 2003. A equipe mdica do hospital expediu um comunicado, aps uma reunio clnica, que havia decidido suspender todas as medidas teraputicas ativas. O comunicado era o seguinte; " A equipe mdica que acompanhou o paciente por trs anos tomou esta deciso coletiva e difcil, de forma totalmente independente". Posteriormente o mdico chefe da equipe, Dr. Frederic Chaussoy, assumiu publicamente que foi ele quem desligou o respirador do paciente. O mdico afirmou que este procedimento no incomum, mas que habitualmente no asumido pelas equipes. A me foi presa por tentativa de assassinato e posteriormente libertada pelo Ministrio Pblico, que se manifestou no sentido de que ela seria processada no momento oportuno. A me foi encaminhada para o Centre hospitalier de l'arrondissement de Montreuil (CHAM), onde ficou internada por 24 horas. O pai de Vincent, Francis Humbert, aprovou a atitude de sua ex-esposa. Caso Vincent Humbert Eutansia Ativa Voluntria

    97. O advogado da famlia, Hughes Vigier, disse, em uma entrevista a TV LCI, que "Ela fez a coisa mais terrvel que uma me pode fazer e ainda assim considera isso uma coisa maravilhosa porque ele queria tanto fazer isso". A maneira pela qual ocorreu a morte do paciente no foi como havia sido inicialmente divulgada. Em 14 de janeiro de 2004, a me de Vincent, Marie Humbert, foi acusada pela justia francesa de "administrao de substncias txicas" e o mdico Frdric Chaussoy foi acusado formalmente por "envenenamento com premeditao", que pode resultar em uma pena de priso perptua. Os advogados do mdica declararam que esta acusao caracterizaria um "erro de direito", por basear-se no direito penal geral e no na questo mdica em particular. Caso Vincent Humbert Eutansia Ativa Voluntria

    98. Eutansia - Holanda Na Holanda a eutansia legalizada. At a aprovao final da nova lei de Eutansia, os artigos do Cdigo Penal continuaram tendo validade. A nova lei, j aprovada na Cmara Baixa e no Senado holands, torna a morte assistida (eutansia ou suicdio assistido) um procedimento legalizado nos Pases Baixos, alterando os artigos 293 e 294 da lei criminal holandesa. A legalizao foi aprovada em 10 de abril de 2001, entrando em vigor em abril de 2002. A Eutansia vem sendo debatida na Holanda desde a dcada de 1970. Inmeras situaes ocorridas com pacientes e seus mdicos geraram questionamentos quanto aos seus aspectos morais e legais. Elas comearam em 1973, com o caso Postma. Desde 1990 o Ministrio da Justia e a Real Associao Mdica Holandesa (RDMA) concordaram em um procedimento de notificao de eutansia. Desta forma, o mdico fica imune de ser acusado, apesar de ter realizado um ato ilegal. A Lei Funeral (Burial Act) de 1993 incorporou os 5 critrios para eutansia e os 3 elementos de notificao do procedimento. Isto tornou a eutansia um procedimento aceito, porm no legal. Estas condies exmem o mdico da acusao de homicdio.

    99. Os cinco critrios, propostos em 1973, duranto o julgamento do caso Postma, e estabelecidos pela Corte de Rotterdam, em 1981, para a ajuda morte no penalizvel, por um mdico, so os seguintes: 1) A solicitao para morrer deve ser uma deciso voluntria feita por um paciente informado; 2) A solicitao deve ser bem considerada por uma pessoa que tenha uma compreenso clara e correta de sua condio e de outras possibilidades. A pessoa deve ser capaz de ponderar estas opes, e deve ter feito tal poderao; 3) O desejo de morrer deve ter alguma durao; 4) Deve haver sofrimento fsico ou mental que seja inaceitvel ou insuportvel; 5) A consultoria com um colega obrigatria. O acordo entre o Ministrio da Justia e a Real Associao Mdica da Holanda, estabelece 3 elementos para notificao: 1) O mdico que realizar a eutansia ou suicdio assistido no deve dar um atestado de bito por morte natural. Ele deve informar a autoridade mdica local utilizando um extenso questionrio ; 2) A autoridade mdica local relatar a morte ao promotor do distrito; 3) O promotor do distrito decidir se haver ou no acusao contra o mdico. Eutansia - Holanda

    100. Se o mdico seguir as 5 recomendaes o promotor no far a acusao. Em um estudo publicado em fevereiro de 2000, foi apresentado um levantamento 649 casos de eutansia (535) e de suicdio assistido (114). Muitas solicitaes de suicdio assistido acabaram tornando-se eutansia pela necessidade do mdico intervir diretamente na administrao da droga em dose letal, devido a inabilidade dos pacientes em executar o procedimento ou intervalo de tempo muito longo entre a administrao do medicamento e a morte. Em 3% dos casos de eutansia e em 6% dos casos de suicdio assistido ocorreram complicaes com os pacientes antes de sua morte. A nova lei, aprovada com 104 votos favorveis e 40 contrrios, em 28 de novembro de 2000, incorpora algumas novas questes, tais como a possibilidade de realizar este tipo de procedimento em menores de idade, a partir dos 12 anos. Dos 12 aos 16 anos a solicitao do paciente deve ser acompanhada pela autorizao dos pais. Alm dos critrios, j previamente em vigor, mais um foi includo, o que estabelece que o trmino da vida deva ser feito de uma maneira medicamente apropriada. Em 11 de abril de 2001 o senado aprovou esta mesma lei. Houve protestos populares contra esta medida, apesar de haver uma maioria expressiva da populao ter se manifestado favoravelmente a este respeito em pesquisas de opinio pblica. Os novos critrios legais estabelecem que a eutansia s pode ser realizada: Quando o paciente tiver uma doena incurvel e estiver com dores insuportveis. O paciente deve ter pedido, voluntariamente, para morrer. Depois que um segundo mdico tiver emitido sua opinio sobre o caso. Eutansia - Holanda

    101. Holanda legaliza a eutansia Zero Hora 11/04/2001 Apesar de alguns protestos, cerca de 90% dos holandeses aprovam a medida, conforme as pesquisas Haia A Holanda tornou-se ontem o primeiro pas do mundo a legalizar a eutansia. Por 46 votos a favor e 28 contra, o Senado aprovou a lei que permitir aos mdicos abreviar a vida de doentes terminais. Do lado de fora do parlamento, com sede em Haia, cerca de 10 mil manifestantes protestaram contra a aprovao da lei, que j havia passado pela Cmara dos Deputados em novembro de 2000. Eles cantavam hinos religiosos e liam passagens da Bblia. Apesar dos protestos, pesquisas indicam que cerca de 90% dos holandeses apiam a eutansia. A nova legislao, que dever entrar em vigor em meados do ano, formalizar uma prtica que j vinha sendo adotada h dcadas em hospitais holandeses. Isso permitir que as pessoas faam suas prprias escolhas elogiou Tamora Langley, da Voluntary Euthanasia Society, uma organizao britnica pr-eutansia. Os mdicos tero que obedecer regras rigorosas para praticar a eutansia (veja no quadro abaixo). O caso tambm deve ser submetido ao controle de comisses regionais encarregadas de fiscalizar se os requisitos foram cumpridos. As comisses sero integradas por um mdico, um jurista e um especialista em tica.

    102. Holanda legaliza a eutansia Zero Hora 11/04/2001 Os menores de idade, entre 12 e 16 anos, tambm podero recorrer eutansia, desde que tenham o consentimento de seus pais. Segundo a nova lei, a prtica s poder ser realizada por mdicos que acompanhem de perto e h muito tempo a sade de seus pacientes. A nova lei tambm permite que pacientes deixem um pedido por escrito. Isso dar aos mdicos o direito de usar seus prprios critrios quando seus pacientes no puderem mais decidir por eles mesmos por conta de doenas. O texto da lei foi aprovado oficialmente ontem, mas, na prtica, a eutansia j era tolerada sob condies especiais desde 1997. Apenas no ano passado, houve 2.123 casos oficiais de eutansia na Holanda 1.893 doentes de cncer pediram a um mdico que terminasse com suas vidas, o que representa 89% do total das eutansias realizadas no pas em 2000. Depois, aparecem pacientes com doenas neurolgicas, pulmonares e cardiovasculares. Nas semanas que precederam o debate da lei, o Senado recebeu mais de 60 mil cartas, a maioria delas pedindo que os parlamentares votassem contra a aprovao da lei. O grupo contrrio eutansia Cry for Life, por exemplo, juntou 25 mil assinaturas em um abaixo-assinado. Egbert Schuurman, parlamentar da Unio Crist, classificou a aprovao da lei de erro histrico.

    103. Holanda legaliza a eutansia Zero Hora 11/04/2001 Ser o primeiro pas a legalizar a eutansia algo para se ter vergonha disse Schuurman. As organizaes contrrias prtica alegam motivos religiosos e ticos. Ontem, cerca de 8 mil pessoas se reuniram em frente ao Senado, em um protesto silencioso contra a aprovao da medida. A manifestao foi convocada por um organizao que agrupa 30 associaes religiosas. Somos contra o assassinato deliberado de pacientes disse Alex van Vuren, do grupo Cry For Life. REQUISITOS A eutansia ser permitida na Holanda se forem cumpridos os seguintes requisitos: Quando o paciente tiver uma doena incurvel e estiver com dores insuportveis. O paciente deve ter pedido, voluntariamente, para morrer. Depois que um segundo mdico tiver emitido sua opinio sobre o caso.

    104. Eutansia - Uruguai O Uruguai, talvez, tenha sido o primeiro pas do mundo a legislar sobre a possibilidade de ser realizada eutansia no mundo. Em 1o. de agosto de 1934, quando entrou em vigor atual Cdigo Penal uruguaio, foi caracterizado o "homicdio piedoso", no artigo 37 do captulo III, que aborda a questo das causas de impunidade. De acordo com a legislao uruguaia, facultado ao juz a exonerao do castigo a quem realizou este tipo de procedimento, desde que preencha trs condies bsicas: ter antecedentes honrveis; ser realizado por motivo piedoso, e a vtima ter feito reiteradas splicas. A proposta uruguaia, elaborada em 1933, muito semelhante a utilizado na Holanda, a partir de 1993. Em ambos os casos, no h uma autorizao para a realizao da eutansia, mas sim uma possibilidade do indivduo que for o agente do procedimento ficar impune, desde que cumpridas as condies bsicas estabelecidas. Esta legislao foi baseada na doutrina estabelecida pelo penalista espanhol Jimnez de Asa. Vale destacar que, de acordo com o artigo 315 deste mesmo Cdigo, isto no se aplica ao suicdio assistido, isto quando uma pessoa auxilia outra a se suicidar. Nesta situao h a caracterizao de um delito, sem a possibilidade de perdo judicial.

    105. Comentrios sobre a Declarao sobre Eutansia Vaticano 1980 Nada nem ningum pode de qualquer forma permitir que um ser humano inocente seja morto, seja ele um feto ou um embrio, uma criana ou um adulto, um velho ou algum sofrendo de uma doena incurvel, ou uma pessoa que est morrendo. O Princpio do Duplo Efeito est proposto no item III deste documento. admissvel utilizar medicao analgsica com o objetico de reduzir dor insuportvel, mesmo que um efeito colateral no intencional seja a morte do indivduo. O importante caracterizar a inteno da ao. Esta colocao se baseia na tica das Virtudes. Se vista dentro de uma perspectiva Consequencialista a aplicao deste conceito poderia ser discutvel. Este documento da Igreja Catlica admite que medidas extraordinrias, de acordo com o risco, sofrimento ou custo associado podem no ser implantadas em pacientes com morte iminente. Faculta, igualmente, a utilizao e retirada de medidas experimentais, quando procedimentos teraputicos usuais no estejam disponveis.

    106. Futilidade A futilidade deve ser definida em funo da relao existente entre tratamento, teraputica e cuidado. Um tratamento considerado ftil quando no tem boa probabilidade de ter valor teraputico, isto , quando agrega riscos crescentes sem um benefcio associado. Vale salientar que aes que visam o cuidado do paciente nunca so fteis. As medidas de conforto bsico, alimentao, hidratao e controle de dor so exemplos de cuidados que podem ser denominados de medidas de conforto, que no podem ser chamadas de fteis. Schneiderman LJ, Jecker NS. Wrong medicine: doctors, patients and futile treatment. Baltimore: Johns Hospkins, 1995:8. Futilidade a ausncia de uma finalidade til ou resultado til em um procediemnto diagnstico ou interveno teraputica. A determinao da futilidade algumas vezes envolve um julgamento de valor, particularmente quando a qualidade de vida o objetivo.

    107. Categorias de Tratamento Glenn McGee estabeleceu cinco categorias possveis para os tramentos: Tratamento teraputico aquele que visa reduzir sintomas, bloqueando a evoluo da doena ou promovendo condies para o reestabelecimento do organismo; Tratamento paliativo aquele que visa reduzir os sintomas, sem alterara a evoluo da doena ou situao de anormalidade que se encontra o indivduo; Tratamento para avaliao aquele utilizado para estabelizar uma condio do paciente visando possibilitar a realizao de exames diagnsticos; Tratamento ftil aceitvel aquele que no gera qualquer benefcio para o paciente, mas o preserva vivo por motivos imperiosos, por exemplo, at aguardar a chegada de um familiar; Tratamento preventivo aquele que visa impedir que uma situao ainda no existente no organismo se instale, como por exemplo as imunizaes.

    108. Critrios para Abordagem do Processo de Retirada de Tratamento O Prof. Gail Povar props que a retirada de tratamento, quando justificada moral e tcnicamente, deva seguir alguns critrios essenciais, que so clareza, comunicao, cuidado e fechamento. Clareza Compreenso clara do envolvimento de todas as partes interessadas no diagnstico, prognstico, objetivos teraputicos e critrios utilizados para a retirada do tratamento. Comunicao Troca contnua de informaes entre os profissionais que esto atendendo o paciente, atualizando mudanas e permitindo o acompanhamento da evoluo do caso, com suas diferentes perspectivas pessoais. Cuidado Reconhecimento dos impedimentos emocionais em retirar o tratamento e responder a esta proposta de maneira sensvel. Envolve o paciente, familiares e membros da equipe, que podem estar ambivalentes sobre a retirada do tratamento. Fechamento Processamento das informaes, aps a morte do paciente, com a finalidade de revisar o atendimento prestado, refletir sobre os aspectos ticos envolvidos e permitir que o processo de luto ocorra. Esta proposta contempla desde as situaes iniciais, envolvidas no proceso de tomada de deciso, at a finalizao do caso como um todo. Esta abordagem abrangente tem um forte contedo preventivo, evitando desgastes entre todos os participantes em uma situao to difcil.

    109. Caso Karen Ann Quinlan Karen Ann Quinlan, tinha 22 anos de idade. Em 15/04/75 entrou na emergncia do Newton Memorial Hospital, de New Jersey/EEUU, em estado de coma, de etiologia nunca esclarecida. Dez dias aps, foi transferida para o Hospital St. Clair de New Jersey . Os pais adotivos, Joseph e Julia Quinlan, tendo as informaes da irreversibilidade do caso e aps conversarem com seu proco, Pe. Trapasso, solicitaram, em 01/08/75, a retirada do respirador. O Dr. Morse, que era o mdico assistente, aps ter concordado com a solicitao no primeiro momento, se negou, no dia seguinte, alegando problemas morais e profissionais. A famia foi justia solicitar a autorizao para suspender todas as medidas extraordinrias, alegando que a paciente havia manifestado, anteriormente, que no gostaria de ficar viva, mantida por aparelhos. O juiz Juiz Muir, responsvel pelo caso, em 10/11/75, no autorizou a retirada dos aparelhos. O juiz baseou a sua negativa no fato da paciente ter dado esta declarao fora do contexto real, ora vigente.

    110. Caso Karen Ann Quinlan A famlia apelou para a Suprema Corte de New Jersey, que designou o Comit de tica do Hospital St. Clair como responsvel para estabelecer o prognstico da paciente e assegurar que a mesma nunca seria capaz de retornar a um "estado cognitivo sapiente". O Comit no existia, at ento. O juz presumiu, erradamente, que a maioria dos hospitais americanos possuiam comits de tica. Baseou-se para tal no artigo da Dra. Karen Teel. O Comit foi criado e deu parecer de irreversibilidade. Em 31/03/76, a Suprema Corte de New Jersey concedeu, por sete votos a zero, o direito da famlia em solicitar o desligamento dos equipamentos de suporte extraordinrios. Aps isto, a paciente sobreviveu mais 9 anos, sem o uso de respirador e sem qualquer melhora no seu estado neurolgico.

    111. Caso Baby Doe Baby Doe foi um beb que nasceu em 1982, em Bloomington, no estado de Indiana/EEUU, com malformaes mltiplas (trissomia do 21 e fstula traqueoesofgica). Os seus pais se negaram a assinar um termo autorizando a realizao de uma cirurgia corretiva da fstula, que tinha 50% de chances de lhe salvar a vida. Os pais, que tinham outros dois filhos sadios, alegaram que a criana era muito comprometida. Solicitaram, ainda, que fosse suspendida a alimentao e os demais tratamentos. A equipe mdica solicitou Justia autorizao para realizar a cirurgia, suspendendo, temporariamente o ptrio poder. A Justia negou em primeira instncia. A promotoria apelou e a Suprema Corte do Estado de Indiana se negou a apreciar o caso. Foi feita a tentativa de apelar para a Suprema Corte dos Estados Unidos. O beb, aos seis dias de vida morreu, no dando tempo para que fossem feitas outras tentativas. O advogado da famlia alegou que a me esteve sempre ao lado do beb. Afirmou que "no foi um caso de abandono, mas sim de amor".

    112. Definio de Distansia Distansia a agonia prolongada, a morte com sofrimento fsico ou psicolgico do indivduo lcido. Este termo foi proposto por Morache, em 1904, em seu livro "Naissance et mort", publicado em Paris, pela editora Alcan. Jimnez de Asa L. Libertad de amar y derecho a morir. Buenos Aires: Losada, 1942:403. Distansia tambm pode ser utilizada como a forma de prolongar a vida de modo artificial, sem perspectiva de cura ou melhora. um termo que pode ser confundido,,quando utilizado com este sentido, com a futilidade.

    113. Paciente Terminal aquele que vai morrer num perodo relativamente curto de tempo, de 3 a 6 meses, independentemente das aes mdicas que so colocadas em prtica.

    114. Proposio de Poltica sobre o Cuidado de Pacientes Terminais com Dor Crnica O cuidado de pacientes terminais com dor crnica severa deve possibilitar o tratamento que permita a estes pacientes um final de vida objetivo e digno. Os analgsicos, tanto opiides como no-opiides, esto disponveis e, quando utilizados de modo adequado, podem produzir um alvio efetivo da dor para a maioria dos pacientes terminais. uma incumbncia do mdico, e de todos quantos cuidam de pacientes morrendo com dor crnica severa, compreender claramente a dinmica da experincia da dor, a farmacologia clnica dos analgsicos e as necessidades do paciente, familiares e amigos. , tambm, imperativo, que os governos assegurem que quantidades medicamente necessrias de analgsicos opiides estejam disponveis para sua adequada aplicao no manejo da dor crnica severa. Princpios de manejo clnico da dor crnica severa Quando um paciente est em estado terminal o mdico deve focalizar seus esforos no alvio do sofrimento. A dor apenas um componente do sofrimento do paciente. Entretanto, o impacto que a dor tem na vida do paciente varia desde um desconforto tolervel at a exausto. A experincia clnica tem demonstrado que, em geral, o alivio da dor crnica severa de um paciente terminal no depende tanto do tipo de opiide utilizado, mas, o ponto crtico, maneira com que a droga utilizada.

    115. imperativo, entretanto, que o mdico diferencie a dor aguda e a dor que pode ser esperada como crnica, esta diferenciao pode gerar importantes implicaes no uso de analgsicos opiides. Os seguintes princpios gerais devem orientar o tratamento de dor crnica severa, particularmente, no uso de medicao analgsica. O tratamento deve ser individualizado para satisfazer s necessidades do paciente e mant-lo to confortvel quanto possvel. Deve ser compreendido que as necessidades do paciente com dor crnica so diferentes daquelas dos pacientes com dores agudas. O mdico deve conhecer a potncia, durao de ao e efeitos colaterais dos analgsicos disponveis para selecionar a droga apropriada, assim como a dose, via de administrao e horrios que assegurem um alvio adequado dor do paciente. Proposio de Poltica sobre o Cuidado de Pacientes Terminais com Dor Crnica

    116. A combinao de anagsicos opiides e no-opiides pode possibilitar um alvio maior da dor dos pacientes nos quais os analgsicos no-opiides no so mais suficientes. Isto pode ser atingido sem que se produza, concomitantemente, um maior potencial de efeitos colaterais indesejveis. O desenvolvimento de tolerncia aos efeitos analgsicos de um agonista opiide pode ser superado pela substituio de um agonista opiide alternativo. Isto se baseia na falta de uma completa tolerncia cruzada entre os diferentes analgsicos opiides. A dependncia iatrognica no deve ser considerada como um problema primrio ao tratar a dor severa em doena neoplsica e nunca deve ser uma razo para no administrar analgsicos fortes em pacientes que podero se beneficiar com eles. Os governos devem examinar a extenso na qual seus sistemas de sade, leis e regulamentaes iro permitir o uso de opiides para objetivos mdicos, identificar os possveis impedimentos a tais usos e desenvolver planos de ao para facilitar o suprimento e a disponibilidade de opiides para todas as indicaes mdicas apropriadas.. Proposio de Poltica sobre o Cuidado de Pacientes Terminais com Dor Crnica

    117. Caso Paciente Terminal Paciente masculino de 74 anos de idade, portador de carcinoma brnquico avanado, com mltiplas metstases sseas, hepticas e cerebrais. Interna por dificuldade respiratria progressiva. No momento da internao queixa-se de muitas dores que no esto sendo controladas por um esquema analgsico muito forte, a base de morfina por via oral, que tambm lhe provoca muitos sintomas desagradveis (nusea, tontura e constipao rebelde). O paciente tem conhecimento do seu diagnstico bem como sua famlia. No seu primeiro dia de internao pede ao seu mdico assistente que no institua nenhuma medida teraputica extraordinria e que acelere sua morte. A famlia tem conhecimento das vontades do paciente e fica dividida: a esposa acha que o paciente deve ser atendido em seus desejos finais, ao passo que seu filho nico acha que os mdicos devem fazer tudo que estiver ao seu alcance para mant-lo vivo. O paciente em uma madrugada apresenta um quadro de insuficincia respiratria aguda, decorrente de um episdio de aspirao de vmito. A equipe de planto decide transferir o paciente para a Unidade de Tratamento Intensivo, uma vez que o mdico assistente no havia sido localizado, no havia qualquer recomendao de conduta em pronturio, o paciente estava sofrendo e a famlia estava dividida com relao aos limites de tratamento.

    118. Caso Paciente Terminal Na UTI o paciente intubado e responde bem ao tratamento clnico com antibiticos, mas permanece clinicamente instvel, com episdios convulsivos , dor e dificuldade respiratria progressiva. O paciente insiste em retornar para seu quarto com o apoio de sua esposa. Seu pedido atendido por seu mdico. O falecimento ocorre em 4 dias, diante de um novo episdio de infeo respiratria, que o seu mdico, sem consultar a famlia, decide no mais tratar.

    119. Princpio do Duplo Efeito Duplo efeito um termo tcnico utlizado em tica que se refere aos dois tipos possveis de consequncias produzidas por uma ao em particular, denominadas de efeitos desejados e para-efeitos indesejveis. Com base neste princpio, que admitida a administrao de altas doses de medicamentos com o objetivo de minorar o sofrimento de um paciente, mas que podero ter como efeito indesejado a sua morte. Esta possibilidade aceita pela Igreja Catlica desde a dcada de 1950. Outras denominaes religiosas tambm admitem utilizar este tipo de argumentao para o tratamento de doentes terminais

    120. A Alienao da Dor A civilizao de consumo conseguiu modificar a experincia da dor, esvaziando do indivduo suas reaes pessoais e transformando essa sensao num problema de ordem puramente tcnica. A supermedicalizao da dor tende a retirar do homem sua participao e sua responsabilidade, criando um novo estilo de sade. Ningum pode negar que o limiar de tolerncia da dor venha sofrendo profundas alteraes e que a medicina moderna torna-se mais e mais cmplice de uma assustadora dependncia farmacolgica e de uma industrializao pela empresa farmacutica. A medicina industrial, para atuar mais prontamente, retira da dor qualquer contexto subjetivo. O sentido da palavra "dor" foi modificada pela linguagem profissional. A nica formula que o modelo mdico atual encontrou de vencer a dor foi torn-la cada vez mais objetiva. To objetiva quanto a linguagem impessoal entre mdicos e enfermeiros. Essa maneira de atuar junto dor desloca o Homem para um novo espao tico e poltico. Nada mais fcil, para entender tais aspectos, que acompanhar a histria da medicalizao da dor. Antes, no era ela tratada, haja vista nada mais representa que um instrumento a servio do diagnstico, dando ao mdico a oportunidade de descobrir qual a harmonia perdida. Durante o tratamento, a dor at poderia desaparecer, mas de fato esse no era o interesse imediato da atividade mdica, para quem a dor significava um certo benefcio em favor da conservao do prprio homem.

    121. Quando a dor perdeu seu sentido csmico e mtico, emancipada de qualquer referencial metafsico, seu controle deu ao indivduo o entendimento de que a sensao dolorosa um ponto clnico objetivo e que pode ser debelado por uma terapia simples e padronizada. Existe um fenmeno coletivo comum s comunidades angustiadas: fazer do normal uma coisa rara. Um desequilbrio fisiolgico antigamente considerado como natural hoje coletivamente medicalizado pela oferta fcil dos que podem dispor de um remdio moderno e ativo. Os meios de divulgao no se cansam de impor populao uma sintomatologia-tipo, facilmente tratada e prontamente curada. Entre elas, a mais comum a dor. Michel Foucault afirma que atualmente a dor foi transformada em problema de economia poltica, em que o homem se coloca como "consumidor de anestesia", procura de tratamento que o faz artificialmente insensvel, ablico e aptico. Ivan Illich observa que esse indivduo no v mais, na dor, uma necessidade natural, mas que ela representa, desde logo, como resultado de uma tecnologia faltosa, de uma legislao injusta ou de uma defasagem social e econmica. A Alienao da Dor

    122. A dor, como objeto de diagnstico e tratamento, classificada como real ou imaginria, foi, sob o ponto de vista scio-econmico, vtima do confisco tcnico do sofrimento, atravs de uma cultura supermedicalizada.Na realidade, o que se tem feito no outra coisa seno medicalizar o sofrimento a palavra "dor de cabea" vai perder seu sentido na linguagem comum e se fortalecer como termo tcnico. Desde o momento em que a dor se tornou coisa manipulvel, passando a ser matria de superproteo, em que o mdico capaz de diagnosticar, medir e provocar esse fenmeno, a sociedade aceitou tal procedimento e rendeu-se a ele, numa forma de soluo para seus fracassos. Entretanto, simplesmente medicalizar a dor correr o risco de perder sua face essencial. A inclinao da medicina em favor da analgesia se insere num contexto ideolgico e sua eliminao institucional tende a se refletir na angstia dos dias de hoje. O prprio progresso social passou a ser sinnimo de ausncia de sofrimento, em que a comunidade empresa teria como alvo no o sentido de alcanar a felicidade, mas o de minimizar o sofrimento. A tendncia ser essa empresa fabricar um remdio para cada mal: para o tdio, para a tristeza e para a insatisfao, assim como criou medicamentos para a dor. A Alienao da Dor

    123. No se pode condenar a sociedade de agora, por estar dominada pela analgesia, mesmo que ela comece a perder sua fantasia, sua liberdade e sua conscincia. Mas desta maneira que ela foge da angstia e da solido dois monstros que ameaam a existncia humana. E chegar um dia em que os choques, os tumultos, as catstrofes, a violncia e o horror sero os nicos estmulos capazes de chamar a ateno do homem para si mesmo e de ter a certeza que ainda est vivo. Por outro lado, comea a surgir, mais fluentemente, um novo tipo, que se pode chamar de homo crucians (ou, no plural, homines cruciantes "homens dolorosos"). No so pessoas anormais ou paranormais, monomanacos, interessadas apenas em ocupar sua ateno com a dor chamada psicognica. So indivduos intimamente ligados aos valores humanos e que se colocam em permanente estado de sofrimento. Essa dor no se localiza. Ela envolve toda personalidade. A histria do homem doloroso a mesma de todas as histrias humanas, a que no faltam mrtires e heris. Ele desponta e se alimenta de um meio social de valores desequilibrados, da atraindo todo sofrimento para si prprio. A viso humanista do mdico deve enxergar esses indivduos como uma unidade distinta, autnoma, dentro de uma realidade prpria, compreendendo suas nsias e seus sonhares, segundo sua convices e no de acordo com as normas ortodoxas da lex artis. A Alienao da Dor

    124. Suicdio Suicdio um ato voluntrio pelo qual uma pessoa tem a inteno e provoca a sua prpria morte. O suicdio pode ser realizado por atos (tiro ou envenenamento) ou por omisso (greve de fome). O que comum a ambas as formas de suicdio a introduo de uma causa de morte, no existente anteriormente. deBlois J, Norris P, O'Rourke K. A primer for health care ethics. Washington: Georgetown, 1995:182 Vrios autores escreveram sobre o tema do suicdio. Um dos mais destacados textos sobre este tema talvez seja o escrito por David Hume, publicado em 1783, denominado On Suicide.

    125. Suicdio Assistido O suicdio assistido ocorre quando uma pessoa, que no consegue concretizar sozinha sua inteno de morrer, e solicita o auxlio de um outroa indivduo. A assistncia ao suicdio de outra pessoa pode ser feita por atos (prescrio de doses altas de medicao e indicao de uso) ou, de forma mais passiva, atravs de persuaso ou de encorajamento. Em ambas as formas, a pessoa que contribui para a ocorrncia da morte da outra, compactua com a inteno de morrer atravs da utilizao de um agente causal. O suicdio assistido ganhou notoriedade atravs do Dr. Jack Kevorkian, que nos Estados Unidos, j o praticou vrias vezes em diferentes pontos do pas, por solicitao de pacientes de diferentes patologias. Existe uma instituio, denominada de Hemlock Society (ou Sociedade Cicuta), numa clara aluso ao suicdio de Scrates. Esta Sociedade publicou, em 1991, um livro, A Soluo Final, que apresentava inmeras maneiras de um paciente terminal ou com doenas degenerativas cometer suicdio. Este livro vendeu mais de 3 milhes de cpias nos Estados Unidos. No Brasil, onde foi tambm traduzido, no causou maior impacto.

    126. Por outro lado, associaes como Not Dead Yet (ainda no mortos), de pessoas portadoras de deficiencias fsicas, caracterizam esta possibilidade como sendo um padro duplo (duplo standard) que os discrimina frente ao restante da sociedade. Em 08 de janeiro de 1997 a Suprema Corte de Justia dos Estados Unidos, julgando o caso Quill, declarou no haver diferenas morais ou legais entre no implantar ou retirar um tratamento e auxiliar um paciente a suicidar-se. Posteriormente, em 26 de junho de 1997, a Suprema Corte Norte Americana alterou este raciocnio, voltando a admitir que existem diferenas marcantes entre estes procedimentos. Ramon SanPedro, um espanhol tetraplgico que havia solicitado na Justia vrias vezes que lhe fosse permitida a eutansia, acabou morrendo aps 29 anos de solicitaes, atravs de um suicdio assistido. Este ato final foi gravado em vdeo como forma de documentar a sua ao pessoal na administrao da medicao em dose letal. Suicdio Assistido

    127. Desde 1997 o estado norte-americano de Oregon tem uma Lei vigente que possibilita aos seus residentes solicitarem o auxlio para se suicidarem. No ano de 1999, foram registrados oficialmente 33 casos de suicdio assistido. A Sua tambm permite a realizao do suicdio assistido, inclusive podendo ser realizado sem a participao de um mdico e o a pessoa que deseja morrer no necessita estar em fase terminal. A base legal o Cdigo Penal de 1918, que afirma que o suicdio no crime. O nico impedimento quando o motivo for egoista, por parte de quem auxilia. A Eutansia no est pervista na legislao sua. Suicdio Assistido

    128. Caso Diane - Quill O Dr. Timothy Quill atendeu por muitos anos a uma paciente, chamada Diane, de 45 anos, e a sua famlia. No incio da dcada de 1990, esta paciente recebeu o diagnstico de leucemia mieloctica aguda. Aps conversar com a famlia e seu mdico, ela recusou ser tratada atravs de quimioterapia, pelos riscos e desconfortos que poderiam ocorrer em funo deste procedimento. Ela estava plenamente capaz e todas as alternativas para aliviar o seu sofrimento foram discutidas e rejeitadas. Ela solicitou a ajuda do mdico para se suicidar. O Dr. Quill, j havia defendido o direito dos pacientes decidirem sobre o seus tratamentos e de poderem morrer com o mximo de dignidade e controle possvel, em vrios artigos. Ele aceitou participar do suicdio da sua paciente. Ele que forneceu os barbitricos que a paciente utilizou. Ela se preparou para o momento de tomar a medicao, usando as roupas que mais gostava e despedindo-se dos familiares. O Dr. Quill foi chamado e deu o atestado de bito, afirmando que a paciente havia morrido de leucemia aguda.

    129. O caso foi levado para a Justia do estado de Nova Iorque e o Dr. Quill e o jri no o incriminou pelo ocorrido. Posteriormente, em janeiro de 1997, a segunda instncia da Justia nova-iorquina afirmou no haver diferenas entre no implantar ou retirar uma medida teraputica e auxiliar um paciente a cometer seu suicdio. Em 26 de junho de 1997, alterou este raciocnio, afirmando que "existe uma importante diferena entre o suicdio assistido e no iniciar ou retirar um tratamento de suporte vital, uma distino reconhecida tanto por profissionais da Medicina como do Direito". Alguns dos mais renomados autores na rea da Biotica, tais como Beauchamp e Childress, acham que a atitude do Dr. Quill no foi errada. A sua conduta, em um caso dramtico como este, foi considerada como eticamente adequada. Caso Diane - Quill

    130. Suicdio Assistido - Oregon-EEUU O estado norte-americano do Oregon aprovou uma Lei sobre Morte Digna ( Measure 16), que foi a primeira legalizao de suicdio assistido nos EEUU, em 08 de novembro de 1994. Esta lei estabelece todos os critrios mninos a serem atingidos para que uma pessoa possa ter acesso a prescrio de medicamentos e de informaes que lhe possibilitaro morrer. O mdico assistente dever chamar um colega em consultoria para confirmao do diagnstico. Tambm poder ser feita uma avaliao da capacidade da pessoa que est solicitando o procedimento, a ser feita por um profissional habilitado. Os prazos mnimos para reflexo foram estabelecidos, assim como os instrumentos necessrios para a documentao adequada de todos os critrios, prazos e manifestao de vontade. Uma curiosidade que a lei afirma que este procedimento no se constitui em eutansia, suicdio ou suicdio assistido. No dia 05 de novembro de 1997 foi feito um plebicito no estado do Oregon com o objetivo de rejeitar a continuidade da lei vigente. O resultado, com uma participao de 80% dos eleitores aptos, foi de 60% pela manuteno da lei e 40% pela sua revogao. O governo dos Estados Unidos est estudando sanes contra os mdicos do estado do Oregon que participarem de alguma forma dos procedimentos de um suicdio assistido. O Procurador Geral dos EEUU tem o poder de cassar a licena de um mdico que prescrever uma substncia para um paciente fora das indicaes de uso consagradas e liberadas legalmente. Prescrever barbituricos para um paciente terminal, como possibilita a Lei do Oregon, se enquadraria perfeitamente nesta situao.

    131. Suicdio Assistido - Oregon-EEUU Duas pessoas j se suicidaram com assistncia de um mdico, desde que a Lei entrou em vigor, que solicitaram e cumpriram todas as etapas para concretizar sua vontade de abreviar o seu perodo de vida. Uma delas foi uma senhora de 80 anos de idade, com cncer de mama. O suicdio assistido foi concretizado no dia 27 de maro de 1998. No ano de 1999, de acordo com dados oficiais, 33 pessoas que desejavam auxlio para morrer tiveram suas solicitaes atendidas. Destas, 27 morreram aps realizarem os procedimentos de ingesto de uma dose letal de drogas, os demais morreram de suas doenas de base. Muitos outros pacientes tambm solicitaram auxlio para morrer, contudo desistiram da idia aps receberem tratamento paliativo, especialmente controle de dor ou outros sintomas, encaminhamento para hospices ou tratamento de depresso.

    132. Dr. Jack Kevorkian O Dr. Jack Kevorkian, mdico patologista aposentado, j auxiliou pelo menos 48 pessoas a cometerem suicdio assistido ou eutansia desde 1990. No primeiro caso em que atuou, em 1990, ele auxiliou uma senhora, chamada Janet Adkins, que desejava morrer, por ter recebido o diagnstico de doena de Alzheimer. O Dr. Kevorkian nunca teve contato direto com a esta senhora antes de realizar os procedimentos que possibilitaram o seu suicdio assistido. Ele atua sem licena mdica desde 1991. Em 1997 vrios relatos de casos de pessoas que foram auxiliadas a cometerem suicdio utilizaram tcnicas que indicam a participao do Dr. Kevorkian, mas sem que o mesmo tenha assumido este fato. Vale lembrar que ele foi processado e inocentado em diferentes estados dos EEUU. Um caso de suicdio assistido por ele realizado, com a Sra. Rebecca Lou Badger, Detroid/EEUU, deixou algumas pessoas muito preocupadas com os critrios utilizados para a realizao dos procedimentos. Esta senhora, ento com 39 anos, era tida como portadora de esclerose mltipla. Solicitou a assistncia do Dr. Kevorkian para a realizao de suicdio assistido. Foi submetida a necrpsia onde no foi constatada qualquer evidncia da doena que teria sido utilizada como justificativa para terminar com a sua vida.

    133. Em novembro de 1998, o Dr. Kevorkian realizou uma eutansia ativa, isto , fez todos os procedimentos necessrios para que um paciente viesse a morrer. Gravou toda a sequncia de aes e divulgou mundialmente pela televiso. Em 25 de novembro a promotoria do estado de Michigan fez uma acusao formal por homicdio. A repercusso mundial foi muito grande, porm os resultados de pesquisas de opinio surpreenderam pelo apoio dado a procedimentos deste tipo. Contudo estes resultados apontam para algumas questes que merecem uma maior reflexo. As pessoas entrevistadas acharam adequado auxiliar as pessoas a morrer, mas concordam que o Dr. Kevorkian deva ser acusado de homicdio, considerando-o, porm, inocente. Estes fatos e consideraes esto por merecer uma abordagem mais ampla no sentido de diferenciar claramente os diferentes procedimentos. A sequencia de procedimentos realizados pelo Dr. Kevorkian refora a proposta de que aceitao de procedimentos como o suicdio assistido podem desencadear uma situao de "slippery slope". Dr. Jack Kevorkian

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