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GEOGRAFIA POLÍTICA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS D a Guerra Fria à Uni-Multipolaridade

GEOGRAFIA POLÍTICA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS D a Guerra Fria à Uni-Multipolaridade. Como reconhecido por todos os analistas da cena internacional, a ordem mundial alterou-se radicalmente com os resultados da Segunda Guerra

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GEOGRAFIA POLÍTICA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS D a Guerra Fria à Uni-Multipolaridade

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Presentation Transcript


  1. GEOGRAFIA POLÍTICA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS Da Guerra Fria à Uni-Multipolaridade

  2. Como reconhecido por todos os analistas da cena internacional, a ordem mundial alterou-se radicalmente com os resultados da Segunda Guerra Mundial, quando dois processos de magnitude mundial atingem o núcleo e a periferia desse sistema. Primeiro, devido à configuração geopolítica que resultou dos acordos do pós-guerra (Conferência de Yalta), quando as duas maiores potências (circunstancialmente) aliadas no conflito estabeleceram os termos da partilha das suas respectivas esferas de influências. A União Soviética ampliou o seu domínio e estendeu-o até o centro da Europa (incluindo a porção oriental da Alemanha), enquanto os EUA assumiam o controle estratégico da porção ocidental do continente, do Atlântico e de boa parte da Bacia do Pacífico, após infligir ali uma pesada derrota às forças japonesas. Com o novo equilíbrio de poder envolvendo essas duas superpotências constituía-se, assim, essa nova ordem, desta feita de natureza bipolar, uma configuração geopolítica inédita na história das relações políticas entre as nações do mundo.

  3. Guerra Fria

  4. Guerra da Coréia (1953) • Os países não-alinhados (1955) • Invasão da Hungria(1956) • Guerra de Suez (1956) • Crise dos Mísseis (1962) • Guerra do Vietnã (1966) • Invasão da Tchecoeslováquia (1968) • América Latina – golpes

  5. Outro aspecto que deve ser destacado nesse período do pós-guerra é a intensificação da crise e, na prática, o colapso do antigo e desgastado sistema colonial, processo estimulado pela combinação da ruína econômica e militar das metrópoles e pela rápida politização dos movimentos internos de diversos países, sobretudo no continente africano. Para alguns desses países, estavam dadas as condições para deflagrarem os seus movimentos de libertação nacional, mesclando-os mais ou menos explicitamente com projetos políticos inspirados no crescimento da influência do socialismo. Como resultado desses movimentos de emancipação, mais intensos durante os anos sessenta, a ONU que se consolidara no seu papel de estrutura funcional desse novo sistema, passou de 51 países-membros, quando da sua criação em 1945, para 120, em 1970.

  6. A criação da ONU em 1945 expressou a dupla face dessas transformações na política internacional. A primeira, porque representou a mais importante experiência de institucionalização desse sistema que superava desse modo a sua natureza de simples concertação interestatal. A segunda porque essa institucionalização mantinha e explicitava o novo equilíbrio de poder, no qual ficava preservado o papel proeminente das grandes potências, ao lado do reconhecimento formal do princípio que assegura a igualdade entre todos os estados soberanos, independentemente do seu poder.

  7. O Mundo em 1945 – segundo a ONU Países fundadores da ONU Outros territórios dependentes Países filiados à ONU após a criação do órgão Estados sob tratado especial com membro da ONU Territórios que em 1949 estavam sob administração da ONU Estados não-membros Territórios administrados pelo mandato da Liga das Nações Fonte:Organização das Nações Unidas

  8. Adesão à ONU (número de países)

  9. Tomando o contexto político mundial do período 1945-1970 como sendo emblemático da constituição do que denominamos de uma ordem mundial contemporânea, cabe sublinhar alguns dos pressupostos e características predominantes dessa ordem, tentando apreender, ao menos, a sua peculiar natureza essencialmente bipolar e os contornos da sua transição atual. Os clássicos da teoria das relações internacionais modernas expressam um razoável consenso quanto aos seus pressupostos essenciais e, de modo geral, formularam as suas teorias justamente no ambiente político que se constituiu a partir dos anos trinta do século passado. Para eles, uma ordem internacional é a expressão das relações entre estados soberanos que operam as suas políticas externas com um duplo objetivo: em primeiro lugar, para assegurar – acima de tudo – os seus próprios interesses nacionais e; em segundo, para operar politicamente com vistas à manutenção de um equilíbrio de poder para, com ele, lograr operar em relativa segurança as suas políticas exclusivas ou aquelas compartilhadas com os seus aliados circunstanciais ou permanentes.

  10. Durante esse período de quatro décadas de características sem precedentes na história humana, o mundo como um todo esteve submetido às incertezas e aos riscos de um quadro de equilíbrio estratégico-militar que, na hipótese de que pudesse ser rompido por uma das partes, poderia ser desencadeado um conflito armado de proporções inéditas, envolvendo o emprego de artefatos termonucleares de enorme capacidade de destruição, cujas escala e conseqüências para toda a humanidade jamais foram devidamente estimadas por qualquer especialista. Daí que, do ponto de vista da história moderna das relações internacionais baseadas em um sistema de estados e em princípios como o equilíbrio do poder, a explosão das duas bombas atômicas pelos EUA em Hiroshima e Nagasaki, no Japão, em 1945, constituem eventos que simbolizam o início de uma nova era para o mundo. Alçada a um novo patamar com a tecnologia nuclear, a corrida armamentista entre as potências significava desta feita, pela primeira vez, a possibilidade concreta de que em um eventual conflito entre elas a própria sobrevivência da espécie estaria ameaçada.

  11. O ápice dessa corrida nuclear e das tensões ocorreu entre o início dos anos cinqüenta o final dos anos sessenta, durante o qual se sucederam diversos episódios que abalaram seriamente a estabilidade internacional e a segurança coletiva na escala mundial. Em 1949 a União Soviética promovia com sucesso o primeiro teste da sua bomba nuclear. Em 1951 os EUA testaram o seu primeiro artefato termonuclear, ou a bomba de hidrogênio, seguidos pela União Soviética, em 1952. Neste mesmo ano, a Grã-Bretanha entrará nesse clube e, em 1957 já possui também a sua bomba de hidrogênio, seguida pela França (1960 e 1968) e pela China (1964 e 1967).

  12. Dentre todas elas, a Europa Ocidental foi a que mais duramente sofreu os efeitos diretos dessas rivalidades, já que as fronteiras entre as áreas sob o domínio dos dois pólos de poder foram estabelecidas justamente na sua porção centro-oriental (mais uma vez), repartindo a Alemanha em duas (incluindo a sua antiga Capital, Berlim) mediante limites fortificados e com as tropas militares de cada lado postadas de forma agressiva nesse palco de tensões e conflitos potenciais. A Europa também representou o pretexto e o foco das preocupações das duas grandes potências, quando estas estruturaram as alianças militares correspondentes a cada um dos blocos antagônicos, a OTAN e o Pacto de Varsóvia. Finalmente, será nesse continente que cada um dos lados também instalará ali parte relevante do seu poder de fogo, com destaque para os artefatos nucleares posicionados em mísseis de médio alcance e direcionados para atingir não apenas o continente europeu, como também parte da Ásia e a América. Episódios como a guerra da Coréia, de 1952 a 1954, a Revolução Cubana, em 1959, a chamada crise da Baía dos Porcos em Cuba (tentativa da URSS de instalar ali uma bateria de mísseis), em 1962, a guerra do Vietnã (1968-1975) e a eclosão de inúmeros movimentos nacionais de descolonização na África e na Ásia, são representativos das situações nas quais as fricções de intensidades variadas se repetiram, envolvendo boa parte das regiões do mundo, especialmente nas bordas dos respectivos sistemas político-territoriais de influência de cada um das potências mundiais.

  13. A maioria dos analistas dessa ordem internacional atribui justamente a essa permanente e eficaz política de contenção praticada sistematicamente pelas superpotências, a relativa estabilidade mundial durante os anos da vigência da Guerra Fria, pois, diferentemente de outros períodos históricos, nos quais o equilíbrio de poder e a estabilidade sempre dependeram dos movimentos nem sempre previsíveis de um grupo de grandes potências européias com projetos políticos em geral pouco convergentes, nesse caso, os riscos globais de um confronto nuclear terminaram por se constituir, paradoxalmente, na melhor garantia da paz, conforme assinala Raymond Aron: “Sem dúvida o efeito mais visível do armamento termonuclear foi dissuadir as duas superpotências de chegar à guerra total, incitando-as à moderação, obrigando-as a respeitar mutuamente seus interesses vitais. A tese otimista da paz pelo terror (ou pelo menos, a limitação das guerras pelo medo ao apocalipse termonuclear), fundamenta-se na experiência da humanidade desde o fim da Segunda Grande Guerra.”

  14. Apesar dessa aparência de inflexibilidade, abrangência, eficiência, estabilidade e perenidade demonstrada pela ordem bipolar sustentada no período da Guerra Fria, ela também estava sujeita, como as outras que a precederam, às forças de dissolução associadas à imprevisibilidade da dinâmica da política internacional, sempre presentes ao longo da história dos estados modernos. No caso em particular, como podem e devem ser procurados e examinados os pontos vitais de vulnerabilidade e ineficiência desse sistema internacional ou, posto em outros termos, as suas linhas de fratura mais expostas, e as suas próprias contradições que o desgastariam nas suas áreas vitais e acabariam por conduzi-lo, afinal, a um irreversível processo de desestabilização e à sua posterior bancarrota?

  15. A questão crucial é que em sistemas desse tipo há um preço a pagar, imposto pelo sistemático funcionamento dessa lógica: a cada passo nessa expansão, tenderão a crescer na mesma proporção os desafios representados pelo controle e a gestão dos territórios, populações e sistemas culturais e políticos crescentemente diversificados. Agrava esse quadro, o fato de que esse crescimento também ampliará as distâncias entre a periferia e o hard core desses mega-impérios. Especialmente em sistemas comandados por uma explícita política de poder, ou seja, pela preponderância da força militar, é previsível que o exercício de um controle permanente em territórios remotos requererá uma logística complexa e de grande escala, em condições, portanto, de enfrentar os movimentos centrífugos, ou seja, as reivindicações por autonomia de todos os tipos, as rebeliões, ou mais explicitamente as revoltas separatistas, muitas delas ocorrendo justamente nas bordas do seu largo espaço de domínio. Em suma, para arranjos político-territoriais com tais características é praticamente inescapável que a sua expansão e manutenção promovam, ao mesmo tempo, o desenvolvimento das contra-forçase dos fatores que poderão um dia minar as suas bases, conduzindo-os ao declínio e à sua própria dissolução.

  16. Em segundo, em nenhum sistema internacional sob a hegemonia de uma ou mais potências a sua expansão e consolidação resultou no desaparecimento das chamadas médias potências ou potências regionais, fato que demonstra, em última hipótese, que a construção e a manutenção de um equilíbrio entre os principais pólos de poder possam ter que conviver com um eventual e indesejável processo de descentralização que poderá expressar-se mediante a dissonância ou a aspirações e projetos de “autonomia estratégica” de uma ou mais delas. Guardadas as devidas proporções, uma potência média envolvida em um projeto de construção da sua autonomia no interior de um sistema marcado pela inflexibilidade, não deixa de representar, no presente, o papel equivalente ao de um reino, de um principado ou de uma “província rebelde” no âmbito dos antigos impérios. Daí que seria praticamente impossível para uma ordem internacional contemporânea – como a bipolar, por exemplo - evitar que pudessem florescer nas suas fímbrias e bordas experiências de diversos tipos e intensidades, compreendendo novos e antigos estados de expressão média, e que de algum modo estivessem envolvidos com projetos nacionais de projeção do poder nos seus respectivos contextos regionais.

  17. Trata-se de processo que revela, mesmo que muitas vezes de forma sutil, a forte tendência de desenvolver um movimento policêntriconas camadas inferiores àquela na qual operam com exclusividade as potências de primeira ordem.

  18. Em terceiro, é lógica e empiricamente improvável que uma ordem internacional contemporânea como a bipolar, que era formada por uma grande, hierarquizada e diversificada constelação de estados soberanos (muitos dos quais com a independência recém-conquistada), pudesse ser estruturada e comandada à moda dos antigos sistemas de tipo imperial, isto é, a partir de um nível máximo de rigidez que pudesse se refletir horizontalmente – em toda a extensão do espaço político mundial – e verticalmente – em todas as camadas da hierarquia de poder político dos estados. A rigor, uma estrutura de rigidez absoluta como essa só poderia ser concebida enquanto um modelo teórico puramente imaginário, pois nenhum sistema político – nacional ou internacional – desse tipo teria condições reais de existência.

  19. Ainda que fosse possível uma experiência em que ele pudesse ali ser eventualmente testado, construindo-o intencionalmente em uma situação-limite de máxima contração, ou seja, segundo a lógica e os elementos típicos de um estado unitário, hiper-centralizado e absolutamente totalitário, por exemplo, os resultados demonstrariam a ocorrência de condições nas quais se manteriam ou seriam alavancados movimentos de natureza excêntrica e de diversas intensidades nessa estrutura, na qual as fissuras não tardariam a se fazer presentes. Em síntese, esse hipotético modelo político-territorial não prosperaria, pois a natureza intrinsecamente diversa e dinâmica dos arranjos político-culturais locais e regionais se encarregaria com o tempo de inviabilizá-lo, na prática. Caso se tentasse transpor esse modelo para os sistemas internacionais, demonstrar-se-ia ainda mais evidente a sua inadequação teórica e prática, pois nesses casos a inspiração e a força motriz dos movimentos excêntricos e a ocorrência das inevitáveis fissuras na sua estrutura político-territorial, derivarão não apenas de princípios e aspirações de autonomia sob diversas formas, mas em um nível superior de complexidade, da própria soberania dos estados.

  20. Martin Wight sintetiza de forma simples e contundente esse movimento: “Eles eram militarmente ineficazes, mas enquanto os blocos comunista e ocidental estivessem em equilíbrio no que se refere ao poderio atômico, eles poderiam esperar, de alguma forma, manejar o equilíbrio de poder. Censuravam, contudo, mais o imperialismo ocidental, que haviam experimentado, do que o imperialismo soviético, que só conheciam por dele terem ouvido falar. Tinham a tendência de identificar as potências ocidentais com o passado, e as potências comunistas, com todas as suas falhas, com o futuro, ao qual eles próprios pertenceriam. Eram também revolucionários, reivindicavam uma mudança no status quo, pois guardavam rancor da diferença cada vez maior entre os padrões de vida deles próprios e da minoria privilegiada da espécie humana que vivia na América do norte e na Europa Ocidental, que constitui um sexto da população mundial, mas que possui um terço da riqueza. Isto lhes deu uma comunhão de perspectiva com as potências comunistas contra o Ocidente conservador, além de um duplo padrão para julgar as duas grandes potências, o que acabou por se tornar mais um fator na guerra fria.”

  21. A primeira é que na história das relações entre política e território, talvez nenhum outro período tenha ilustrado de forma mais eloqüentea predominância de um generalizado quadro de disjunções entre fronteiras políticas e fronteiras étnico-culturais. Nesse processo, grupos étnicos de todos os tipos e inúmeras comunidades tribais primitivas africanos que jamais haviam colocado para si próprios o imperativo de se constituírem em comunidades políticas nacionais territorialmente definidas, mediante fronteiras precisas (naquele seu significado que possuem para o estado soberano europeu clássico), acabaram sendo segregadas ou confinadas – com o emprego de mecanismos explícitos de coerção externa - em compartimentos territoriais diversos e sob o domínio de uma ou mais administrações coloniais. Com isso, segundo a sua lógica e de modo arbitrário, o domínio colonial implantou na África uma particular configuração geopolítica que se sobrepôs de modo cruel a uma diversidade cultural que abrangia 700 grupos étnicos e 1.200 línguas.

  22. Segundo Michel Foucher, que elaborou um notável estudo sobre esses e outros temas relacionados às questões fronteiriças em todo o mundo, mais da metade de todas as fronteiras da África e da Ásia foram implantadas pela Inglaterra e pela França, as duas mais importantes potências coloniais de todos os tempos e quase 90% do total desses traçados na África foram feitos entre 1895 e 1910, ou seja, em um período de apenas quinze anos.

  23. A segunda reforça a nossa convicção de que todas as fronteiras nacionais são artificiais por excelência, uma qualidade que lhes é intrínseca, e que é demonstrada sistematicamente pelos fatos que acompanham a história da constituição dos estados soberanos e das relações que estes estabelecem entre si – o sistema de estados ou o sistema internacional – um processo que indica a predominância da natureza política das fronteiras ou, mais especificamente, da sua natureza geopolítica.

  24. Logo, que elas constituem linhas e zonas com estabilidade e perenidade relativas e, por vezes, provisórias, pois sempre serão o resultado dos direitos conquistados (a maior parte deles pela violência das guerras) adquiridos ou acordados por dois ou mais estados. Por conseguinte, as fronteiras são configurações ao mesmo tempo jurídicas e geopolíticas por excelência, pois os seus traçados sempre dependerão de resultados mutuamente acordados mediante tratados específicos. Em suma, sejam elas rígidas, fortificadas, flexíveis, porosas ou abertas, as fronteiras tendem a manter esse seu significado primordial para o exercício da soberania dos estados nacionais.

  25. Colonização da África

  26. Descolonização da África

  27. Asia divided: conflict in the middle of the nineteenth century Fonte: World Bank, 2009

  28. Essa identidade terceiro-mundista que de certo modo opunha-se à lógica de poder do sistema bipolar fortaleceu-se e a original estratégia política desse grupo de países culminou com a realização da importante Conferência Afro-Asiática de Bandung, em 1955, na qual foi explicitada essa posição frente às questões políticas e de desenvolvimento em geral no mundo e, sobretudo, foram lançadas ali as raízes do que viria a se constituir no movimento dos países não-alinhados (fundado em 1962) e na criação do chamado Grupo dos 77 na política internacional. Outro evento que provocou um forte abalo nos fundamentos desse sistema foi representado pela revolução socialista na China, país que em 1949, tornou-se uma República Socialista, após mais de uma década de guerra civil com forte conteúdo ideológico. Apesar de tratar-se ainda de um país pobre e basicamente camponês, muitos analistas da cena internacional rapidamente observaram que pela sua grande dimensão territorial, população numerosa, força militar expressiva e um regime político altamente centralizado, estava emergindo uma nova potência regional na Ásia com amplas possibilidades – e certamente com aspirações políticas - de atuar de modo decisivo no cenário internacional.

  29. Assim, enquanto em uma das frentes de atuação, concentrava-se em um claro esforço de posicionar-se de forma autônoma face às duas potências hegemônicas, em outra, explicitava sem rodeios os seus objetivos de hegemonia no seu espaço geopolítico regional. Neste caso, e em um movimento que tirava evidente proveito da sua vantagem comparativa diante do Japão - o seu proverbial oponente na região e que havia sido praticamente destruído pela guerra – a China projetou rapidamente as suas políticas de poder no Sudeste Asiático, envolvendo-se diretamente na Guerra da Coréia (1952-1954) e na Guerra do Vietnã (1968-1975), em ambas alinhando-se incondicionalmente às forças comunistas. No primeiro evento, postou-se ao lado da URSS em apoio aos comunistas do norte, enfrentando as tropas norte-americanas e seus aliados, ali enviadas sob o manto institucional do Conselho de Segurança da ONU. No segundo, apoiou abertamente a frente popular liderada pelos comunistas, forjada nas lutas nacionais de libertação contra a França e, em seguida, contra a intervenção norte-americana.

  30. Países Não-Alinhados

  31. A origem do Movimento pode ser encontrada na Conferência Ásia-África realizada em Bandung, Indonésia, em 1955. A convite dos primeiros-ministros da Birmânia (hoje Mianmar), do Ceilão (hoje Sri Lanka), da Índia, da Indonésia e do Paquistão, dirigentes de 29 países, quase todos ex-colônias dos dois continentes, reuniram-se para debater preocupações comuns e coordenar posições no campo das relações internacionais. O primeiro-ministro indiano Jawaharlal Nehru, juntamente com os primeiros-ministros Sukarno (da Indonésia) e Gamal Abdel Nasser (Egito), presidiu a sessão. No encontro, líderes do então assim chamado Terceiro Mundo puderam compartilhar as suas dificuldades em resistir às pressões das grandes potências, em manter a sua independência e em opor-se ao colonialismo e ao neocolonialismo.

  32. Os acontecimentos dessa época revelam que estava em curso um duplo movimento de largo espectro e longa duração e que seria capaz de moldar a configuração básica das relações internacionais contemporâneas. O primeiro, é aquele representado pela acelerada mundialização dos processos especificamente econômicos, políticos, político-territoriais e estratégico militares, decorrente do alargamento, sem precedentes na história, do número e da capacidade de ação dos estados-nações a partir dos anos cinqüenta. O segundo, é aquele associado à formidável diferenciação do espaço político mundial que apesar da sua rigidez, decorrente de uma ordem bipolar nos aspectos essenciais da repartição e do equilíbrio de poder vigentes, tornou-se viável pelo desenvolvimento simultâneo de uma estrutura razoavelmente hierarquizada e nem sempre coordenada, graças, sobretudo, à existência de uma órbita próxima ao centro, ocupada pelas potências médias e regionais e por outra – periférica - ocupada por mais de uma centena de novos estados, a maioria dos quais com as suas independências recém-conquistadas.

  33. Além disso, a combinação entre as histórias regionais particulares e esse processo de mundialização hierarquizada produziu, também, uma nova regionalização do mundo, do ponto de vista econômico e político-territorial. Ela impulsionou mudanças baseadas em antigas relações de solidariedade, de competição ou de animosidades entre grupos, nações, dinastias e impérios, e que foram substituídas por aquelas vinculadas à nova configuração política mundial, na qual passou a predominar, além das grandes potências com o seu antagonismo estrutural, uma constelação de estados soberanos com as suas novas redes de relações políticas que serão a expressão, em cada caso, dos seus alinhamentos e das posições e prioridades estratégicas nas suas respectivas regiões.

  34. Esse processo de mudanças vai intensificar-se nos anos setenta, marcados por um conjunto de eventos de grande repercussão internacional. Em 1972 ocorre a primeira alteração de monta na antiga e rígida estrutura do sistema bipolar com a celebração do acordo bilateral – diplomático, político e comercial - entre os EUA e a China, um evento que tem sido considerado como um dos mais notáveis das relações internacionais contemporâneas, já que representou a aproximação das duas grandes potências com notórias rivalidades no plano regional asiático e pavimentou, assim, o longo caminho da distensão política mundial e da integração chinesa na economia mundial, processos que se intensificariam a partir da década seguinte.

  35. O terceiro é simbolizado pelo início das negociações entre as duas grandes potências visando o controle e a limitação das suas armas nucleares, em um explícito movimento na direção de uma distensão – a détente- nessa ordem internacional, desde o início da Guerra Fria. Sob esse aspecto, deve-se registrar o importante papel da ONU nesse processo, com diversas iniciativas, como a criação da Comissão de Energia Atômica, em 1946 e da Agência Internacional de Energia Atômica, em1956, culminando pelo Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, em 1968, que passou a vigorar em 1970. É nesse novo ambiente, que a partir de meados da década, os EUA e a União Soviética iniciam as negociações bilaterais visando à redução dos seus respectivos arsenais (o SALT), inaugurando o período da chamada “coexistência pacífica” entre as duas potências em especial durante o governo de Richard Nixon nos EUA. O quarto pode ser associado ao notável crescimento econômico da Europa Ocidental, impulsionado principalmente pelo apoio norte-americano na sua reconstrução do pós-guerra - o Plano Marshall – e pelos efeitos positivos da constituição do Mercado Comum Europeu, formalizado em 1957. Neste caso, os papéis políticos proeminentes da França e da Alemanha foram decisivos, motivadas que estavam, sobretudo, por uma estratégia comum que visava superar a sua secular rivalidade no continente e, ao mesmo tempo, estabelecer uma audaciosa articulação política e econômica que lhes assegurasse condições para construir, no futuro, um projeto próprio na sua região de referência.

  36. Em outros termos, definia-se ali um projeto particularmente europeu que, malgrado as limitações impostas pela sua sensível posição de fronteira entre os dois principais pólos de poder (ou especialmente por isso), pudesse vir a se constituir mais tarde em um caminho próprio de autonomia estratégica. O quinto é representado, como já mencionado, pelo surgimento de novas potências médias e a sua projeção política e estratégica nas respectivas regiões, fato que confirmou uma tendência que se esboçara desde os anos cinqüentae que é um aspecto destacado do já citado processo de diferenciação do espaço político mundial.

  37. Além da China, no Sudeste Asiático, devem ser registrados os casos da Índia, da Turquia, da África do Sul e do Brasil, um grupo de países que pela sua expressão econômica, importância política ou político estratégica, ou mesmo pela combinação dessas vantagens comparativas, passou a exercer papéis de liderança regional, chegando alguns deles a capitanear processos futuros de constituição de blocos regionais de comércio ou de integração mais ampla.

  38. É inegável, portanto, que diversas nações e regiões do mundo (a Europa, o Japão e alguns países do Sudeste Asiático e da América do Sul, principalmente) que souberam tirar proveito de uma situação internacional onde elas pouco contavam em termos dos encargos estratégico-militares de manutenção da ordem, puderam beneficiar-se da nova onda de investimentosde capitais industriais a partir dos anos sessenta e iniciar ciclos mais ou menos dinâmicos de desenvolvimento econômico e de modernização em geral.

  39. Esse processo de transformações da ordem mundial contemporânea teve a sua culminância com os eventos políticos que abalaram os seus pilares durante os anos oitenta e particularmente na passagem para os anos noventa. Como temos tentado apontar nesta breve análise da sua evolução, é mister que especialmente em se tratando dos fenômenos da política internacional, a observação e a análise dos mais decisivos vetores de mudanças que nela operam não se restrinjam aos momentos da sua plena manifestação, ou eclosão, como se estivéssemos diante dos eventos sísmicos que subitamente atingem a crosta terrestre.

  40. Na modalidade de evento dessa amplitude também deve ser incluída a propagação dos impactos causados pela entrada em cena de um novo ator na política internacional, que está associado aos primeiros sinais do que se poderia hoje denominar sociedade civil internacional, um dos fenômenos mais significativos das transformações dessa passagem de século e de milênio. Algumas características desse processo têm sido exaustivamente apontadas pelos analistas da nossa época. Trata-se da emergência de grupos e movimentos políticos que estão estreitamente relacionados à consolidação da democracia nos países centrais do mundo ocidental ou capitalista a partir dos anos sessenta – principalmente - e como decorrência, do fortalecimento das suas próprias sociedades civis nacionais, processo que de modo geral se expandirá para a periferia desse sistema durante os anos oitenta e noventa.

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